O MEDO

0
2250

O medo paralisa. Ele impede de crescer. No entanto, o medo pode servir para a conservação da vida em determinados momentos. Filogeneticamente, o medo está na base de nossas emoções. Para nossos antigos ancestrais, o medo era uma forma de preservar a vida, ao lado da coragem, ao lado da ousadia, ao lado do movimento de defesa frente aos desafios da vida nas florestas e em locais inóspitos.

O medo assola inúmeras pessoas, paralisando as suas vidas. Pode-se ter medo do que os outros possam achar de nossos comportamentos. Pode-se ter medo de sair em determinados horários. Pode-se ter medo em ir em determinados lugares. Pode-se ter medo de sair de um trabalho para ingressar numa outra oportunidade de trabalho. Pode-se ter medo de terminar uma relação amorosa para se abrir às novas possibilidades de uma outra relação. Pode-se ter medo de se dizer o que se pensa para um amigo, pois, este poderá não compreender e, assim, colocar-se em risco a perenidade da relação. Pode-se ter medo de “Deus”. Pode-se ter medo de morrer. Pode-se ter medo dos pais. Pode-se ter medo de amar, pois, amar poderá trazer, mais vez, o risco de sofrer as amarguras das incertezas de uma relação amorosa.

Pode-se ter medo de confiar, pois, os fracassos anteriores ainda falam mais forte através do medo disto acontecer, mais uma vez. Pode-se ter medo de se perder o que já conquistou, pois, foi duro conquistar tudo o que foi conquistado. Pode-se ter medo de ser feliz, pois, a vida, em geral, é tão difícil que, na chegada da felicidade, estranha-se a sua vinda. Pode-se ter medo de viver a vida, pois, a vida nos traz tantas incertezas, tantas inseguranças. A vida é tão imprecisa, tão indeterminada, trazendo-nos sempre uma nova aventura a ser vivida, trazendo-nos sempre mais uma nova questão a ser resolvida… E é sobre o medo de viver que desenvolveremos o nosso encontro de hoje.

“Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo – quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação” – Clarice Lispector. As palavras geniais de Clarice nos indicam que a novidade, a chegada daquilo que nos é estranho pode nos desorientar. No entanto, vivemos a vida acreditando que teremos sempre certeza de tudo.

Agarrando-nos às nossas verdades, agarrando-nos às nossas certezas, acreditamos que tudo será do jeito que já foi. Agarramo-nos nas imagens das situações e das soluções que demos para as tantas outras situações, acreditando que as situações de hoje poderão ser resolvidas da mesma forma. Agarramo-nos nas imagens, nas ideias e nos sentimentos de que as pessoas serão da mesma forma que foram num tempo atrás. Agarramo-nos nas incertas certezas de que seremos amados pelos outros da mesma forma que antes éramos amados. Agarramo-nos na ideia de que seremos elogiados, seremos apreciados, seremos acolhidos da mesma forma que antes.

O medo de viver a vida… o medo de viver a vida como se fosse a primeira vez… Podemos aprender com as crianças. Ao contrário daqueles que desejam viver a vida como se fosse a última vez. As crianças nos ensinam que podemos descobrir sempre um novo caminho a cada dia, a cada instante, a cada segundo. Abrir os olhos de manhã e se abrir ao dia como se fosse a primeira vez. As crianças se abrem para a vida, buscando sempre a novidade, sempre buscando um caminho novo para as descobertas. No entanto, aprendemos a ter medo das descobertas.

Estas colocam em ‘crise’ aquilo que se tornou uma garantia, uma verdade, uma certeza em nós. Abrir-se às descobertas mais simples da vida será abrir-se às sensações pequeninas. Abrir-se ao sol que entra pela janela, simplesmente sentido a sua presença em nosso corpo. Abrir-se a uma música que nos chega e nos envolve. Abrir-se a um abraço de uma pessoa querida que nos envolve de afetos. Abrir-se à novidade da vida, superando o medo de vivê-la nas suas incertezas. Aprender, com as crianças, à abertura à descoberta, à busca de construção do caminho através de um caminhar perene e sempre em frente.

Busque abrir-se à vida!

Abraço fraterno,
Paulo-de-Tarso