Os jornalistas são retratados como heróis no cinema. Essa foi uma das conclusões da tese de doutorado do jornalista e professor de comunicação Vitor Menezes defendida na tarde desta quinta-feira (22). A pesquisa foi apresentada no Programa de Pós-Graduação em Cognição e Linguagem (PGCL), da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), em Campos dos Goytacazes (RJ).

Vitor frisa, no entanto, que a palavra “herói” em sua pesquisa tem mais a ver com “aquele que conduz a trama e não necessariamente com o oposto de vilão”.

“Todos os Homens do Presidente” (1976), “O Abutre” (2014) e “Spotlight” (2015) são os filmes analisados, escolhidos por Vitor com base na recorrência em 20 listas com 476 filmes indicados em sites sobre jornalismo ou correlatos. “Heróis que não recusam o chamado” é o título da tese. Ela analisa o “ethos” dos principais personagens, sempre profissionais da área, a partir de questionários respondidos e conversas com os alunos do autor, no Centro Universitário Fluminense (Uniflu), onde ele leciona.

O primeiro filme, da década de 1970, é baseado em uma resportagem investigativa real que levou à descoberta do escândalo Watergate e teve como consequência a queda do presidente Richard Nixon. Já o longa “O Abutre” é fictício e acompanha um cinegrafista em busca de crimes e acidentes chocantes para vender essas histórias e imagens. “Spotlight”, por sua vez, mostra o trabalho de um grupo de jornalistas que investiga o abuso de crianças por padres católicos.

A Jornada do Herói

O conceito de ethos, aplicado à profissão, é como se fosse uma personalidade coletiva dos jornalistas. Eles inspiram a ficção, mas também são influenciados por ela. Para seus estudos, o professor baseou-se na “Jornada do Herói”, teoria elaborada por Joseph Campbell para estudar ciclos de trajetórias comuns aos heróis da literatura.

O “Chamado à aventura” é um dos momentos do percurso com 12 passagens que começam com “Mundo comum”, passam também pela “Recusa ao chamado”, “Encontro com o mentor”, “Travessia do primeiro limiar”, entre outras, e terminam com o “Retorno com o Elixir” (a consagração do herói). “A observação que fizemos é que os jornalistas dos nossos filmes não fogem ao chamado”, afirma o pesquisador.

Pé firme na realidade

Em “Todos os Homens do Presidente” e “Spotlight”, repórteres e editores não abrem mão do seu dever e são bem-sucedidos ao expor para os cidadãos a criminalidade no governo dos EUA e na Igreja Católica. Nem sempre isso acontece no jornalismo e são inegáveis os erros e até crimes da mídia jornalística que contribuíram para a trágica situação política e social a que o Brasil chegou, principalmente a partir das eleições de 2018.

Lembrando, porém, que os jornalistas não são necessariamente coniventes com os veículos em que trabalham, pode-se dizer que os profissionais brasileiros estão entre os grandes responsáveis pela sobrevivência da nossa democracia, e o pleito presidencial de 2022 é exemplo disso. Num momento em que os profissionais da imprensa passam no mundo inteiro por mais ataques do que sempre sofreram, esses ataques têm relação direta com os abusos de governantes contra a democracia. A reflexão de Menezes tem, portanto, um pé firme na realidade.