Centro, direita, esquerda, e os dois extremos. Em tempos de acentuada polarização ideológica é impossível ficar politicamente neutro. Mas, qual posição política escolher?

Abominando as duas posições extremistas que me parecem fanatismo doentio e obtuso, e convivendo respeitosamente com as demais, há tempos fiz a minha escolha. Escolhi a esquerda. E por que o fiz? Porque sempre me preocupei com as desigualdades sociais.

Me preocupa e me deprime a existência de discriminações, sejam raciais, sexuais, econômicas, religiosas ou educacionais. Apesar de reconhecer algumas atitudes demagógicas de certas lideranças da esquerda, em uma análise geral, eu só percebo preocupações sinceras e concretas, semelhantes às minhas, no pensamento esquerdista. Utopia? Pode até ser, mas é essa a minha percepção.

Antes que minha escolha ideológica gere incompreensão, registro muito claramente que não torço para que os ricos fiquem pobres; o que desejo é que os pobres tenham oportunidades para melhorar de vida, quiçá enriquecer. Simpatizo com a meritocracia, porém, em países pobres e desiguais como o Brasil, não acredito que possamos alcançá-la em curto prazo. Até lá, incentivos, tais como cotas universitárias, são tão necessárias como são os subsídios governamentais e as isenções fiscais para a sobrevivência de empresas privadas estrategicamente importantes.

Às vezes, me perguntam se sou contra os liberais de direita que defendem o livre mercado com regulação de agências governamentais, que pregam a privatização ou extinção de empresas estatais deficitárias, que defendem a liberdade de expressão, que prestigiam o mercado de capitais e universidades pagas por quem pode fazê-lo? Não, não sou. Não sou tão radical assim. Pelo contrário, acho salutar a possibilidade da alternância do poder entre esquerda e direita. Eu não concordo é com os extremistas, já disse.

Sou contra a extrema direita? Ah, sou. E por quê? Porque, além das suas tradicionais posturas ultraconservadoras e preconceituosas (muitas cheias de hipocrisias) tenho cisma com uma eventual total liberdade dos agentes econômicos. Apesar de saber que, comprovadamente, o capitalismo é o sistema que mais produz riqueza, acredito também que, se não houver intervenção e regulação permanente dos governos, é o que mais produz desigualdades. Pode parecer incoerência, mas explicarei. Para produzir riquezas o capitalismo procura maximizar o lucro dos investidores, e para crescer os lucros é óbvio que os custos devem ser os menores possíveis. E aí? Existem vários caminhos para reduzir custos, mas o mais fácil e usual tem sido minimizar o custo da mão de obra, onde reside a eterna luta entre capital e trabalho. O que vale é o lucro acima de tudo, sejam quais forem as consequências. Coerentemente com esse ponto de vista, o guru do liberalismo econômico, Milton Friedman, argumentava, com muita franqueza, que “as corporações não têm de ser responsáveis com a sociedade. Sua única responsabilidade é enriquecer os acionistas e a si próprias”, preconizava ele.

Estou cansado de ouvir alguns empresários da extrema direita falando alto a exigir tratamento fiscal diferenciado e favorável dos governos, jactando-se que geram emprego e renda. E isso é apenas uma meia verdade. Eles realmente geram empregos. Mas, por que o fazem? Empregam pessoas porque necessitam delas como força de trabalho, não por altruísmo. Sempre que puderem trocarão a mão de obra contratada por máquinas que não reivindicam, não fazem greve, não cobram horas extras, não se sindicalizam e nunca acionam a justiça trabalhista. E mais, apesar de femininas, para felicidade desses patrões, as máquinas nunca engravidam.

Afirmo que também sou contra a extrema esquerda, cujas posições, tal como a extrema direita, fogem da racionalidade e descambam para um condenável fanatismo. Em nome do social aceitam e fazem coisas que prejudicam a economia, as próprias relações trabalhistas e os direitos proprietários. Assim, me parece que sejam de direita ou de esquerda, os extremistas têm mais vocação autoritária do que democrática e se igualam nos seus defeitos.

Talvez por isso, estou sempre a lembrar de um velho amigo pernambucano, ferrenho ex-comunista, que se afastou do partidão, dizendo: ”Eu fui tão pra esquerda, mais tanto, tanto, que cai na direita”.

Por Alfeu Valença

Alfeu Valença é ex-presidente da Petrobrás e fundador da CONPET – Consultoria e Engenharia de Petróleo.