Dr. Márcio Barcelos Médico - Foto divulgação

O mundo quedou-se atônito, frente à cruel realidade dessa nova doença que tem ceifado milhares de vidas planeta afora. Centenas de milhares de óbitos no mundo e milhares no Brasil, com perspectivas de aumento. As pessoas estão se perguntando umas às outras, surpresas, como isso é possível.

Estamos no século XXI, temos tecnologias robustas, eficazes e seguras em todas as áreas da atividade humana, incluindo o tratamento e a prevenção da maioria das doenças. Isso é uma parte da verdade. Realmente a inteligência, a capacidade de colaboração, a engenhosidade e o trabalho contínuo são marcas registradas da raça humana, mas infelizmente, apesar do progresso em todas as áreas do conhecimento humano, vamos ter que lidar com o que não conhecemos.

Na área médica teremos novas e agressivas doenças que incidirão, com frequência cada vez maior, no decurso desse século e que não teremos nenhum tratamento específico para combatê-las. E se não mudarmos nossa trajetória, a humanidade terá sérios problemas, não só com germes, mas com a fome, a escassez de água, a desertificação do solo e o aumento da poluição do ar.

É importante deixar claro que a infecção por coronavírus não é nenhuma novidade. Conhecemos essa família de vírus desde meados da década de 60, quando classificamos várias cepas diferentes entre si, mas que tinham em comum não infectar humanos. Menos mal, pois ficava ali no morcego, na cobra, no pangolim (espécie de tatu asiático) e eventualmente em algum animal doméstico em contato com esses animais silvestres citados acima.

Esse cenário sofreu mudanças em 2001/2002, quando devido à mutação/mutações, o coronavírus começou a causar doenças no ser humano na forma de uma síndrome respiratória aguda (SARS) na China, matando 900 pessoas, e no Oriente Médio, em 2013, causou a morte de cerca de 800 pessoas com síndrome respiratória aguda (MERS) e agora o mesmo vírus chega de forma mais agressiva e causa essa pandemia, que tanto sofrimento e morte tem trazido para toda a
humanidade.

A história se repete. Em 1978/1979 tivemos centenas de óbitos em enfermarias e UTIs do Brasil e do mundo, em pacientes que internavam com quadro infeccioso agudo, que rapidamente evoluía para uma pneumonia atípica ou outra infecção grave. Sem sabermos a causa, germes oportunistas estavam nos matando.

Somente em 1981 a ciência descobriu o retrovírus responsável pela pane imunológica no organismo humano, que facilitava as infecções bacterianas fatais. Estava ali definido o HIV e a SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida/AIDS). O
tratamento específico demorou mais alguns anos até acertarmos a mão com o AZT e posteriormente um coquetel de antirretrovirais, que modificou de forma fantástica, para melhor, a vida dos soropositivos. Quanto à vacina para o HIV, estamos ainda devendo à humanidade.

Importante citar uma doença que existe de forma epidêmica em algumas regiões da África, como na República Popular do Congo, Uganda, Zaire e Nigéria, causada pelo vírus Ebola, para o qual não existe vacina segura ou tratamento específico, com mortalidade de mais de 90% e alta transmissibilidade (fluidos corporais), uma verdadeira bomba relógio biológica pulsando no coração da África, pronta para ganhar o mundo, e em 2017 por muito pouco isso não aconteceu.

O que chama atenção a respeito das doenças citadas: coronavírus, AIDS e Ebola é como e quando o ser humano entra nessa história. Parece que está ficando cada vez mais claro que é exatamente quando a maré humana (crescimento populacional/fome) se aproxima de nichos ecológicos dos quais deveríamos manter distância.

Na África, a relação muito estreita do homem com o macaco, aliado à caça e consumo de carne, foram fatores que ocasionaram as primeiras transmissões do HIV para o homem. A caça e consumo de morcegos, cobras e pangolins parece estar relacionada à infecção humana por coronavírus na Ásia, assim como o consumo de morcegos e outros animais silvestres estão relacionados à infecção humana por Ebola
em algumas regiões da África.

Em relação a essa pandemia do coronavírus, encontraremos uma solução, foi assim com o HIV, embora não tendo ainda uma vacina efetiva, temos medicações bastante eficazes no seu controle, assim como a previsão de lançamento de uma vacina efetiva para a doença causada pelo vírus Ebola prevista para os meses de setembro/outubro próximos.

Os sintomas da infecção por coronavírus são leves em 85/90% dos casos, simulam um resfriado e/ou gripe com febre, mialgia, dor de garganta, tosse não produtiva e diminuição do olfato e paladar. Dez por cento dos casos têm necessidade de internação hospitalar e deste percentual 3 a 4% evolui para dificuldade respiratória e pneumonia atípica necessitando de suporte ventilatório (respirador mecânico).

Quanto ao tratamento da Covid-19, não existe vacina ou droga específica. A critério médico, estão sendo utilizadas várias medicações: analgésicos, antitérmicos, antibióticos, antimaláricos (Cloroquina), Zinco, antirretrovirais (Remdezivir),
anticoagulantes e oxigênio.

O aprendizado tem sido muito grande nessa pandemia, não só do ponto de vista médico como em outras áreas. O isolamento social, o funcionamento do comércio e indústria somente para atividades essenciais, a higienização das mãos e superfícies de trabalho com água e sabão, álcool a 70% e álcool em gel, com certeza são atitudes de grande valor, objetivando diminuir a transmissibilidade do vírus e evitar o estrangulamento do sistema de saúde. Na dúvida, o melhor é seguir as orientações das autoridades sanitárias locais, OMS e Ministério da Saúde.

Para o bem e para o mal, nós humanos conseguimos, com tecnologia, reconectar com todos os continentes, através das nossas viagens.. Recriamos uma nova Pangeia (nome dado a um único continente que existiu no passado remoto). As vantagens da modernidade são inúmeras, as desvantagens também. Hoje, dependendo das conexões aéreas é possível dar a volta ao mundo em menos de 36 horas, juntos com os germes, obviamente.

Outro fato que essa pandemia trouxe à tona foi a constatação de que a produção de insumos, medicamentos e máquinas está concentrada em determinada região (na maioria, a China), o que se transformou em um grande problema para todos, uma lição a ser levada em consideração pela humanidade. Precisamos ter uma diversificação geográfica na produção industrial, sob pena de na ocorrência de uma futura pandemia, ou até mesmo nessa que estamos vivendo, perdermos pacientes,
não somente pela doença em si, mas pela falta de equipamentos para combatê-la. Será importante definir o que é estratégico produzir em solo brasileiro, incentivando a indústria nacional.

Em Macaé, o combate a essa pandemia tem contado com um Prefeito absolutamente comprometido com a situação, tomando decisões bastante acertadas, após ouvir sanitaristas, infectologistas, epidemiologistas, a universidade, a vigilância em saúde municipal, enfim, compartilhando todos os protocolos a serem seguidos. Com isso, até o momento, os números dessa pandemia estão sendo absorvidos pela nossa estrutura municipal de saúde com tranquilidade e profissionalismo. A adesão e compreensão da população muito tem ajudado e será fundamental para conseguirmos ultrapassar os períodos críticos da pandemia.

A necessidade de acertarmos os passos no combate ao coronavírus com todos os entes federados engloba união, coesão e o compartilhamento único de medidas entre os governos federal, estadual e municipal, que seria o maior trunfo para alcançar resultados, não somente na preservação da vida dos brasileiros como no retorno à normalidade.

Fica o registro do excelente trabalho de todos os profissionais de saúde, os verdadeiros heróis que estão à frente da grande missão de salvar vidas.

Dr. Márcio Barcelos
Médico

 

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