Estilo de vida saudável estimula o cérebro e previne a demência em idosos

Esquecimento, perda auditiva e um pouco de lentidão são algumas das mudanças mais frequentemente associadas ao envelhecimento.

Ao longo dos anos, o cérebro humano tende a perder mais neurônios, formar menos conexões e até diminuir levemente em tamanho e massa, o que pode afetar seu funcionamento.

Mas nem todos os idosos vão ter uma perda cognitiva acentuada: existe grande diferença entre o envelhecimento normal e o marcado por doenças que afetam o raciocínio e a memória – cognitivas – ou que corrompem o sistema nervoso – neurodegenerativas.

Em relação à memória, por exemplo, é comum esquecer informações menos importantes ou repetitivas, como saber onde ouviu uma informação ou lembrar-se de tomar medicamentos antes do café da manhã.

No entanto, a capacidade de se lembrar de acontecimentos da própria vida e de habilidades, como andar de bicicleta, deve se manter relativamente estável ao longo da vida.

A dificuldade acentuada com esses tipos de memórias pode ser um sinal do início de perda cognitiva, um dos dois fatores da demência.

Outros sinais são aumento na dificuldade de concentração, compreensão e raciocínio.

Para caracterizar um quadro de demência, que pode se expressar em diversas doenças, é preciso que haja também uma dificuldade para realizar tarefas do dia a dia.

Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 9,5% das pessoas acima de 60 anos no Brasil têm limitações para realizar atividades de vida diária, como ir ao banheiro, se alimentar e se vestir.

Essa porcentagem aumenta significativamente após os 75 anos.

As causas exatas da demência ainda são incertas, mas cientistas acreditam que existem fatores genéticos, sociais e ambientais que possibilitam ou aceleram essa degradação do cérebro e a perda da capacidade cognitiva, que afetam, atualmente, cerca de 2 milhões de brasileiros, de acordo com o Ministério da Saúde. Natan Feter, pesquisador e coordenador da Comissão Científica de Educação Física da Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer), afirma que, em 30 anos, esse número pode chegar a 4 milhões – e 50% desses novos casos são preveníveis.

“Os maiores fatores de risco para a demência no Brasil são a perda auditiva e a inatividade física. Ao manter um estilo de vida saudável, podemos evitar mais de 2 milhões de casos de demência no futuro.”

Kátia Ploner, psicóloga especialista em envelhecimento, explica que a convivência social e as atividades em grupo são um dos aspectos mais importantes para cuidar da saúde mental e prevenir o declínio cognitivo em idosos: “Atividade física, por exemplo, é importante, mas melhor ainda se for feita com um grupo.

Se você tem seis pessoas no seu grupo, vai ter que interagir com elas, lembrar o nome dos parentes delas, e isso estimula a memória e o raciocínio.”

A psicóloga também destaca a importância do suporte da família quando há sinais de isolamento:

“A depressão, que pode causar problemas cognitivos, precisa ser entendida pelos familiares, que muitas vezes pensam que é coisa da velhice. Se o idoso deixa de sair e de fazer o que gosta, pode ser um sinal de depressão e precisa de auxílio psicológico.”

12 fatores de risco para a demência:

Estudo publicado na revista médica Lancet em 2020 aponta que ter uma vida saudável com base nesses 12 fatores pode reduzir em pelo menos 35% o risco de doenças que causam a demência, como Alzheimer e Parkinson

  • Baixa escolaridade Estudos apontam que um maior acesso à educação na juventude aumenta as capacidades cognitivas do cérebro e a chance de o indivíduo continuar se interessando por atividades que estimulam a mente ao longo da vida.
  • Perda auditiva: A capacidade de ouvir estimula a atividade cerebral. Estudos observaram que indivíduos com perda auditiva não tratada podem ter uma aceleração de 30% a 40% no declínio cognitivo, enquanto usuários de aparelho auditivo não apresentam esse risco.
  • Consumo excessivo de álcool: A pesquisa aponta o aumento do risco de demência em pessoas que consomem mais de 21 unidades de álcool por semana, visto que a OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda a ingestão de até 12 unidades por semana para uma vida saudável. Uma unidade alcóolica corresponde, aproximadamente, a uma taça de vinho ou meia lata de cerveja.
  • Isolamento social: O contato social é um fator protetivo para doenças cognitivas, já que estimula resistência a lesões no cérebro e comportamentos saudáveis. No Brasil, cerca de 31% dos idosos afirmam viver em solidão, o que aumenta as chances de desenvolver demência, além de intensificar outros fatores de risco, como a depressão.
  • Poluição do ar: Estudos recentes apontam a ligação entre a demência e a exposição a ar poluído e a pesticidas, já que podem aumentar as chances de doenças ou inflamações vasculares no cérebro.
  • Obesidade
  • Tabagismo
  • Depressão
  • Traumatismo cranioencefálico
  • Hipertensão
  • Sedentarismo
  • Diabetes

Discriminação na saúde: muito mais negros morrem por demência no Brasil

Um estudo publicado em 2021 pelos pesquisadores Natan Feter e Jayne Leite aponta que, durante a pandemia de Covid-19, a taxa de mortalidade por demência no Brasil diminuiu em 9% entre brancos e aumentou em 65% e 43% entre pretos e pardos.

Na região Sul, a diferença foi ainda maior: a mortalidade por demência entre brancos diminuiu 19%, enquanto a entre pretos e pardos aumentou 90% e 176%, respectivamente.

Feter aponta que a causa para isso é o menor acesso que pessoas negras têm à saúde durante toda a vida:

“Quando um paciente preto ou pardo chega ao hospital com demência, ele já está num estágio mais avançado da doença. Ele tem mais chance de ter tido baixa escolaridade e menos acesso ao tratamento para fatores de risco, como hipertensão, obesidade ou diabetes.”

Ele afirma que, quando uma pessoa negra entra num hospital público com demência, sua chance de morrer no hospital é de mais de 60%.

Segundo pesquisas conduzidas nos EUA, o risco de demência também é desproporcionalmente maior em outras minorias sociais, como em pessoas LGBTQIAP+.

“O isolamento social e o estigma geram uma dificuldade muito maior no acesso à saúde para essa população”, explica o pesquisador.

DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS MAIS COMUNS

Alzheimer

Responsável por 50% a 70% dos casos de demência no mundo, a doença afeta 1,2 milhões de brasileiros, segundo a Abraz. Acredita-se que a predisposição genética seja responsável por pelo menos 1% a 5% dos casos, enquanto os principais fatores de risco externos são lesões cerebrais, depressão e hipertensão arterial.

O primeiro sintoma da doença é um aumento anormal da perda de memória de curto prazo.

Em 2023, um estudo publicado na revista científica Journal of Alzheimer’s Disease apontou que as vacinas contra a gripe comum, contra tétano, difteria e coqueluche, contra a herpes-zóster e contra a meningite podem reduzir o risco de Alzheimer de 25% a até 40%.

Parkinson

No Brasil, são 200 mil pessoas acometidas pela Doença de Parkinson, segundo o IBGE. A doença nem sempre causa perda cognitiva, mas afeta todo o sistema nervoso e corrompe a parte do cérebro responsável pela coordenação motora, dificultando os movimentos.

Na fase inicial da doença, os principais sintomas são os tremores.

A causa da doença também é desconhecida e provavelmente multifatorial, mas estudos recentes acreditam que o consumo de quantidades moderadas de café diariamente podem reduzir o risco de Parkinson em até 30%.

ELA (Esclerose Lateral Amiotrófica)

A esclerose lateral amiotrófica é considerada uma doença rara, que atinge cerca de 0,002% da população mundial e cerca de 6.000 brasileiros.

A ELA causa a morte progressiva dos neurônios motores e é caracterizada por rigidez muscular, espasmos e fraqueza, que geralmente resultam em câimbras e dificuldade para falar, engolir e respirar.

A doença é causada por fatores genéticos em 10% dos casos e costuma se manifestar a partir dos 40 a 60 anos. O tabagismo é um dos fatores de risco mais severos e chega a dobrar a chance de desenvolver ELA.

Por ND Mais