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Musicoterapia e subjetividade sonoro-musicais

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A música nos afeta desde muito pequeninos. As canções movem os balanços do corpo da mãe que envolve o corpinho de seu filho. Um campo de afetos nasce desta experiência. O olhar do bebê que acompanha o olhar de sua mãe no ato mesmo de receber os banhos sonoros advindos do canto que ela lhe proporciona. Um sorriso nasce no semblante do bebê. Ele afeta e comunica à sua mãe os afetos de vitalidade, ou seja, as emoções que o ligam nela Emoções de interesse, de estar acoplado e conectado ao que acontece no processo desta experiência, o desejo dele estar dirigido à novidade do presente, fato que é construído pelo ‘berço sonoro-musical’ que a sua mãe proporciona com o canto e com o embalo de seu corpo. As formas de sentir a vida já começam muito antes, desde o útero. Quando nascido, o bebê vai sendo tocado por inúmeros campos de experiências que vão, de pouco a pouco, produzindo suas formas de sentir, de pensar e de agir na relação com os outros. Suas capacidades afetivas vão sendo estimuladas, ou não, dependendo da forma como as pessoas que o circundam o afetam. Estas capacidades afetivas Spinoza, filósofo do século XVII, chamou como ‘grau de potência’. Nosso grau de potência varia a cada situação, a cada encontro.

Numa dada situação podemos ser afetados de tal modo, diminuindo a nossa vitalidade, isto é, produzindo tristezas. Por outro lado, uma outra situação pode nos tocar de tal modo, aumentando a nossa potência de existir, produzindo-nos alegrias.

A música possui a potência de nos afetar de tantas maneiras. Uma música nos afeta, produzindo-nos imagens de tantas situações já vividas, ou ainda por viver. A música nos proporciona a experiência de nos deslocarmos no tempo. O presente é vivido com imagens e sensações de situações que vivemos. Estas imagens e sensações nos envolvem a partir do envolvimento que temos com a música. Esta possui a potência de ativar aquilo que estava no fundo de nossas existências, revelando, desvelando, muitas vezes, sentidos que não estavam claros. Uma mesma música pode nos oferecer paisagens de novos caminhos. Ela nos retira das nossas repetições, das ideias e desejos que se cronificaram ao longo do tempo em nossas vidas.

A música é a arte dos processos. A vida é feita de dinâmicas, de movimentos, de paralisações, cadências, ritmos tão variados. A música é a grande metáfora para sentirmos os processos da vida. Transformar-se na vida, dar novos movimentos, aprender a dar novos ritmos, novas cadências à vida será entrar no processo de transformação, ou seja, de dar novas formas às nossas capacidades de sentir, pensar e agir na relação com o mundo. A musicoterapia é a abordagem clínica onde a experiência sonoro-musical contribui na produção de novos sentidos a partir de um campo de sensibilidades onde a palavra ganha a sua dimensão poética.

Desta forma, as palavras tomam outras formas. Assim como a água pode ganhar as formas sólidas, gasosas, líquidas e através do vapor, a palavra pode ganhar a sua dimensão expressiva através do canto, da expressão poético-musical, de novos ritmos e cadências, podendo mudar a forma de subjetividade daquele que entra em relação com ela na relação com o terapeuta. A integração mente-corpo se tece nos ambientes onde este processo se desenvolve. A vivência do presente, habitar o presente através do contato com a experiência musical será dar corpo à existência de outras formas inabituais, desenvolvendo-se a capacidade de sentir de outras maneiras, de poder sentir a vida de tantas maneiras o quanto for possível, inspirando-nos aqui de Fernando Pessoa.

Alinho-me à perspectiva da musicoterapeuta Marly Chagas que em sua tese de doutorado sobre os ‘Processos de Subjetivação na Música e na Clínica em Musicoterapia’, apresentada ao corpo docente do EICOS/IP – da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, no ano de 2007, desenvolve a bela perspectiva dos processos de subjetivação, dos processos de modulação das formas de sentir, pensar e agir através dos campos de experiências sonoro-musicais.

Desenvolver as capacidades das pessoas sentirem a vida, pensarem a vida de forma criadora, tecendo a vida como um compositor de encontros é uma arte na qual me inclino todos os dias.

Grande abraço,
Paulo-de-Tarso
Email para contato: paulo.tarso.peixoto@gmail.com

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