Ao longo da vida vamos colecionando histórias. Colecionamos imagens, colecionamos encontros que fazem parte de nós. Nem sempre compreendemos estas coleções. Muitas vezes nos encontramos com as imagens destas coleções. Entramos em contato com imagens que fizeram sentido nas situações já vividas, já passadas. Mas, hoje estas imagens não tocam mais como antes.

Somos colecionadores de histórias. Colecionamos, também, as emoções que acompanham estas histórias. Me lembro de quando a minha mãe tocava piano todas as tardes de todos os dias. Sempre às quatro horas da tarde. O perfume do café e do bolo quentinho vindo se juntar às sonoridades do piano tocado por suas mãos. Tenho a imagem do olhar dela em contato pleno com os movimentos de seus dedos que deslizavam nas teclas. Ela brincava de passear nos caminhos das teclas brancas e pretas para fazer brotar melodias que alimentavam a minha alma. E o perfume do café e do bolo quentinho estava lá nos envolvendo, juntamente com as imagens do sol das quatro horas. A luminosidade refletida nas árvores da casa à frente tocava os meus olhos, invadindo o espaço onde a música, o perfume do café e do bolo se misturavam com a imagem de minha mãe. Esta imagem complexa faz parte da minha coleção de histórias.

Vamos colecionando tantas histórias importantes. No entanto, vamos deixando-as de lado, pois, nos ocupamos com tantas coisas, com tantas atividades e obrigações. As histórias que possuem uma carga afetiva singular e importante para nós começa a se evanescer em nossas memórias. A vida num presente vazio de sentido, mas, preenchido por tantas tarefas é o que pode predominar nestes casos.

Assim, vejo muitas pessoas sofrendo de um vazio existencial, de um vazio de sentido de vida. Muitas pessoas me procuram como terapeuta para tratar destas questões. Percebo como o sentido de vida, para muitas pessoas, somente foi dirigido na construção de projetos de trabalho, de realização profissional. Quando o trabalho não está mais dando prazer o sentido da vida, por sua vez, também se perde. Esta é uma das questões que podemos verificar. No entanto, podemos perguntar: como você se sente nas situações onde a decepção, a frustração com alguma pessoa parece desmoronar todas as crenças, tudo aquilo que você acreditava? Isso pode acontecer nas relações amorosas, de amizade, de vizinhança e, mesmo, nas relações de trabalho. Como estamos uma grande parte do tempo se relacionando com pessoas do trabalho é comum acreditarmos que somos “amigos” de alguém pelo fato de, com ele, passarmos longas jornadas, meses e anos a fio.

A experiência mostra que nem sempre é assim. Podemos construir uma história nas nossas mentes e em nossos corações e acreditarmos que temos inúmeros “amigos”. A amizade é um afeto que pode ser explicado da seguinte maneira: a amizade é um afeto nascido de um sentimento de alegria vindo da imagem de alguém que nos proporciona cuidado, atenção, respeito e presença em inúmeras situações, positivas e negativas em nossas vidas.

Podemos colecionar histórias maravilhosas das relações que tivemos ou que ainda temos com as pessoas que fizeram ou ainda fazem parte de nossas vidas. Cuidar destas histórias é cuidar de um bem precioso. Cuidar das histórias de amizade é poder cultivar um tesouro que nós possuímos. Mesmo na relação amorosa: o amor sem cuidado não é amor. O amor com cuidado é o mais profundo ato de amor, pois, nele reside o afeto de amizade. O amor fundado numa relação de cuidado se expressa no dia-a-dia, nos encontros mais triviais, como um ato de amizade. Assim como o grande filósofo Cristo nos ensinou, ele mesmo inspirado nos epicuristas que diziam há trezentos anos antes dele: deseje para o outro aquilo que desejas para você mesmo!

Cuide de suas histórias onde o cuidado, o respeito, a presença das pessoas em sua vida tenha sido construída pelo singelo nome de “amizade”. E, então, quais são as histórias que você coleciona?! Compreender as histórias esteticamente, sensivelmente, é um dos trabalhos que realizo como terapeuta. Entre em contato: paulo.tarso.peixoto@gmail.com.

Abraços!