O Passado e o Presente

Em 1964, o Brasil atravessou um dos períodos mais sombrios de sua história, quando um golpe militar instaurou uma ditadura que silenciou vozes, perseguiu dissidentes e transformou famílias inteiras em vítimas do autoritarismo. Milhares de pessoas, por discordarem do regime imposto, foram presas, torturadas ou forçadas ao exílio. No calor da luta pela democracia e pela liberdade, a sociedade civil se mobilizou, clamando por anistia para os presos políticos. A concessão dessa anistia, embora tardia, foi celebrada como um passo em direção à redemocratização do país, permitindo que muitos retornassem ao lar e recuperassem suas vidas. No entanto, ao olharmos para o presente, somos confrontados com uma triste e alarmante incoerência. Aqueles que foram anistiados, que um dia clamaram por liberdade e justiça, agora se encontram em uma posição contrária, condenando aqueles que, em sua busca por um Brasil mais justo, se opõem a práticas que consideram questionáveis nas últimas eleições. O que aconteceu com o espírito solidário que uniu tantas vozes durante a luta pela anistia?
Hoje, vemos famílias novamente sofrendo com a prisão de seus entes queridos, não por razões ligadas a um regime autoritário, mas pela discordância política em um sistema democrático.

A ironia é palpável: as mesmas pessoas que clamaram por liberdade e justiça agora parecem esquecer a importância da defesa dos direitos humanos e do respeito à pluralidade de opiniões. Aqueles que um dia foram perseguidos agora se tornam os perseguidores, silenciando vozes que não se alinham à sua visão de mundo. A anistia, que deveria ser um símbolo de reconciliação e respeito à diversidade política, tornou-se um instrumento de seletividade. As vozes que outrora pediam a liberdade agora se tornam cúmplices de um sistema que marginaliza e penaliza a dissidência. É imperativo lembrar que a democracia é um espaço que deve acolher o debate, a divergência e a crítica. A verdadeira democracia não se constrói silenciando opositores, mas sim promovendo um diálogo aberto, onde todas as vozes, mesmo as dissonantes, tenham espaço para serem ouvidas.

É fundamental que a sociedade reflita sobre essa incoerência. A luta pela anistia não deve ser apenas uma lembrança do passado, mas uma lição que nos ensina a importância da empatia, da solidariedade e do respeito mútuo. Precisamos lembrar que cada prisão política, cada ato de repressão, causa dor e sofrimento não apenas ao indivíduo, mas a toda a sociedade. Em vez de repetir os erros do passado, devemos nos unir em defesa dos direitos humanos, da justiça e da liberdade de expressão. Como sociedade, temos a responsabilidade de garantir que a história não se repita. Precisamos resgatar o espírito de solidariedade que caracterizou a luta pela anistia e aplicá-lo à realidade atual. É hora de construir um país onde a liberdade de expressão seja respeitada, onde a diversidade de opiniões seja valorizada e onde famílias não sejam separadas por discordâncias políticas.
A verdadeira anistia é aquela que se estende a todos, independentemente de suas convicções. Que possamos aprender com o passado e trabalhar juntos por um futuro onde a liberdade, a justiça e a paz sejam os pilares da nossa sociedade. Coerência já!

Guto Sardinha