Um grave acidente tirou sua alegria de viver, mas a faculdade trouxe de volta o sentido da vida
Algumas situações na vida são valiosos aprendizados, mesmo quando tudo parece estar fora do eixo. Determinados incidentes testam o ser humano no seu limite e induzem à descoberta de uma nova versão de si. O soluço no começo, com o tempo, dá espaço à solução: ressignificação da vida. Para Levi Wenceslau, um paraibano de 36 anos que superou o drama do diagnóstico de tetraplegia, os estudos foram a forma de voltar a ser protagonista da própria história.
No dia em que completava 23 anos, Levi Wenceslau sofreu um grave acidente de carro. O automóvel em que estava com mais cinco amigos colidiu com um cavalo morto na BR-101, no trecho Recife – João Pessoa. Levi caiu nas águas do riacho que corta a ponte da estrada. Com o impacto, sofreu uma fratura na quarta vértebra cervical que o deixou tetraplégico. Os amigos que o acompanhavam, nada sofreram. Seria um carma para Levi? Um tipo de azar? Com certeza, um presente que ele não esperava ganhar.
Levi passou três meses internado com respirador artificial e, após idas e vindas do hospital, teve que se adaptar a viver em uma nova condição: impossibilitado de se mexer do pescoço para baixo. Sentindo-se prisioneiro no próprio corpo, se viu definhando, pouco a pouco, durante a dura e longa trajetória de recuperação. O seu estado de saúde agravara-se com quadro de infecções, pneumonias e até desnutrição. Chegou a pesar 35 quilos, muito pouco para uma pessoa com 1,70 de estatura. Tinha crises nervosas de pânico e feridas profundas na pele. Só dormia sob efeito de medicamentos tarja preta.
“Achei que fosse morrer e até desejei que isso acontecesse logo”
O acidente provocou uma mudança radical na vida de Levi e na de toda sua família. Sob o cuidado dos irmãos – os pais já haviam falecido na época do acidente – conseguiu voltar para casa mediante assinatura de um termo de responsabilidade. Sua condição de vida era frágil e inspirava muitos cuidados. “Em uma situação de extrema dor e impotência, achei que fosse morrer e até desejei que isso acontecesse logo”, relata em seu primeiro livro autobiográfico Cadeira Elétrica, Memórias de quem sobreviveu.
“Como eu vi que não ia morrer, tive que buscar alternativas para sofrer menos”, conta. Por isso, tocar a vida em frente se tornou o maior desafio para o rapaz que ansiava ser músico, sonho que tinha desde garoto. Levi teve depressão, não queria sair de casa e não via sentido para viver. Assim, passou cinco anos recluso, em tratamento psicológico. “Eu queria apenas ocupar o tempo e minha mente para amenizar a dor, o meu sofrimento”, lembra.
Estudar foi um projeto de sobrevivência para Levi, que confessa que não gostava muito de ler e nunca imaginou escrever livros. Quando reconquistou parte da independência, por meio de uma cadeira motorizada que conseguiu através de campanha de arrecadação, cogitou se matricular no curso de Psicologia. Por indicação de um amigo, ficou sabendo da possibilidade de estudar com bolsa através do Educa Mais Brasil e conseguiu 50% de desconto nas mensalidades por meio do programa.
“Ter que sair de casa todos os dias para ir para a faculdade foi fundamental na minha ressocialização”, avalia. Em paralelo aos estudos e à dor, ia registrando a sua luta em um diário. Tempo depois, acatou a sugestão do irmão de escrever livros. Atualmente, dedica-se à terceira obra. Levi é formado há três anos em Psicologia, pela UNIME, e pós-graduado em Logoterapia e Análise existencial. Ele atende em um consultório particular na Bahia, onde reside atualmente. “Sigo aprendendo a sobreviver”, define.
Com o tempo, seu exemplo de superação foi se tornando mais uma ferramenta de trabalho no set terapêutico. Seu ofício consiste em acompanhamento psicológico em casos de transtornos comportamentais e desequilíbrio emocional. Atende a adolescentes, adultos e idosos presencialmente ou via internet. “Aplico os conhecimentos que venho adquirindo ao longo da minha formação como psicólogo clínico, procuro auxiliar as pessoas que chegam até a mim, em busca de acompanhamento profissional, a resolverem suas demandas comportamentais conduzindo-as a se conhecerem mais e se harmonizarem”, explica.
Para Levi, passado o drama, as possibilidades agora são infinitas. Ele pretende continuar estudando e já pensa em fazer mestrado. “Tive que aprender a viver com muitas limitações, descobrir novas capacidades para estar constantemente me adaptando”, finaliza.