OPINIÃO

As frases “Sábio é aquele que conhece os limites da sua própria ignorância” e “Só sei que nada sei…”, atribuídas ao filósofo grego Sócrates, mostram o valor que ele dava à autocrítica e à assunção da própria ignorância.Há mais de 50 anos, eu milito na indústria de petróleo: primeiro na Petrobras e depois na iniciativa privada. Neste período não houve um único dia em que eu tenha deixado de me informar sobre essa indústria, no Brasil e no mundo. Mas, nem assim, eu me arvoro de saber tudo sobre o assunto. A constante e rápida evolução tecnológica, a diversidade das atividades e as interdependências entre elas, além das frequentes instabilidades geopolíticas, fazem ser praticamente impossível alguém manter-se up to date no estado da arte. É, reconhecidamente, uma atividade multidisciplinar.Por isso, me incomoda a pretensa competência de pessoas que, mesmo confundindo poços com buracos, terminais com refinarias, e acreditando que planta de gasolina é alguma espécie exótica de vegetal, tão logo assumem posições com alguma influência na área energética, já discursam, com pompa e circunstância, propondo soluções milagrosas para vários problemas da indústria brasileira de petróleo, alguns até inexistentes. Adotam premissas duvidosas e, baseados nelas, desenvolvem planos e estratégias que, na grande maioria, não ajudam em nada a indústria, mas deixam a impressão de que o petróleo passou a existir após eles se debruçarem sobre o assunto. O grande perigo é que essas pessoas facilmente se deixam influenciar por competentes lobistas que só pensam nos seus próprios negócios, sem nenhuma responsabilidade com o futuro energético do país.Por isso, não me surpreendo quando algumas delas preconizam que o Brasil deve dar as costas aos combustíveis fósseis e voltar-se imediatamente para as fontes alternativas de energia, sem sequer olhar para o exemplo dos países ricos que estão desenvolvendo aquelas alternativas, mas, simultaneamente, estão investindo pesadamente na exploração de petróleo para aumentar as reservas, incrementar a produção, monetizar o produto e, aí então, usar os recursos obtidos para financiar o desenvolvimento das desejadas fontes de energia limpas.

Do mesmo modo, há algum tempo, sob influência de alguns ambientalistas catastróficos, move-se uma campanha contra a utilização, nos poços de petróleo, da técnica de fraturamento de rochas reservatórios para aumentar a permeabilidade das mesmas e, consequentemente, incrementar a produção de óleo e gás. A principal alegação é a possibilidade da contaminação de lençóis de água subterrânea. Tratam o assunto como se tivessem o monopólio da preservação ambiental, e os geólogos e engenheiros de petróleo do mundo inteiro fossem um bando de irresponsáveis que não sabem avaliar os riscos e não utilizassem técnicas especiais para eliminá-los, quando existirem. É o mal da generalização.Existem locais onde as características das rochas impedem o uso da técnica, e em outros não oferecem o menor risco. Essa tecnologia de fraturamento de poços tem mais de 50 anos, e é amplamente dominada e permanentemente aperfeiçoada. Nos locais onde existem riscos incontornáveis, simplesmente não é usada. No Brasil, já foi largamente utilizada em poços terrestres e marítimos, sem registro de um único acidente ecológico. Adotada há mais de 15 anos em larga escala em rochas permianas, nos Estados Unidos, tornou aquele país autossuficiente em gás natural. Atualmente, na Argentina, o campo de Vaca Muerta, onde se usa a mesma técnica, é responsável pela metade da produção de hidrocarbonetos do país. Nos dois casos, nenhum acidente ambiental importante foi reportado até hoje.Alguns países (França, Bulgária, República Checa e Irlanda) normalmente citados como exemplos por terem proibido a técnica de fraturamento, não têm nenhuma tradição ou significado na produção de petróleo. Ou seja, proibiram o que não tinham!

Mais recentemente, sob o pretexto de aumentar a oferta de gás natural, algumas autoridades advogam a condenação da reinjeção do gás produzido nos campos de petróleo, contrariando mundialmente utilizada técnica para manter a pressão dos reservatórios rochosos. Conhecida como recuperação secundária (quem sabe se começarmos a falar em “enhanced recovery” será mais respeitada?), a injeção de gás aumenta substancialmente a produção diária de óleo e o volume total recuperável das jazidas. Dito isto, basta comparar o valor do óleo cru adicionalmente produzido com o valor do gás injetado para encerrar a polêmica, que nem deveria existir. Acrescente-se que grande volume do gás injetado contém contaminantes como CO2 ou H2S, o que ajuda a evitar poluição atmosférica.O que não falta no Brasil são experientes geólogos, geofísicos e engenheiros de petróleo com competência técnica, internacionalmente reconhecida. Por que não os ouvir?Parece que, por aqui, está faltando um pouco da humildade socrática.

Por: Alfeu ValençaEx-presidente da Petrobrás e fundador da CONPET Consultoria e Engenharia de Petróleo.Alfeu assina a coluna no site https://temporealrj.com/alfeu/