Fiz parte de uma época em que falar, falar tudo, era incentivado. Adquiriu valor, a coragem de dizer ao outro tudo o que se pensava. O desabafo tornou-se uma necessidade primária. Em nome dos seus benefícios, foram verbalizados verdadeiros escalabros. Essa prática era geral, inclusive adequada à comunicação dos filhos com seus pais, entre amigos, nas relações profissionais. O resultado a médio prazo não foi bom, sobraram pessoas com os dentes arreganhados, rosnando para o mais próximo.
A língua pode ser um chicote, dependendo da palavra dita, tem o poder de dilacerar o coração. Uma colega minha dos bancos de faculdade costumava se preparar para encontrar uma pessoa nefasta, afirmando: “Vou dar uma surra de língua!” Espancava o outro com palavras, sem dó. A vítima rebatia os golpes, mas minha amiga era mais técnica. Dispunha não só de um vasto repertório de palavras, como uma admirável habilidade em arrumar as palavras. Sua argumentação era imbatível. O perdedor sempre terminava estirado no tatame, ensopado de humilhação.
Observa-se, especialmente nos relacionamentos familiares, a prática de brigas sempre aos gritos. Parece que quando mais íntimo o relacionamento, mais berros. A gritaria é a exata medida da distância entre as pessoas. O outro está tão longe emocionalmente, que para se fazer ouvir é preciso gritar. Ao contrário dos enamorados, que quando juntos, pouco falam. E quando o fazem é um murmúrio, quase sussurrando.
De outro lado, para muitos o silêncio incomoda, principalmente quando na companhia de alguém. Cuida para que ele não se instaure, porque o vazio gerado é temerário, carrega uma ameaça de sei lá o quê. A solução mais fácil é começar a falar, sem parar, falar muito, falar qualquer coisa. As palavras também servem para afastar as pessoas. Mas o silêncio tem a sua face amiga, ele tem alguns aliados, como essas pequenas palavras: não sei’, ‘posso pensar?’, ‘amanhã’, ‘falo depois’ ou simplesmente um sonoro e retumbante NÃO. Assim mesmo, curto e grosso. Ele se basta, especialmente quando dito num tom médio.
Aprendemos a dizer ‘não’, essa poderosa palavra, em torno de dois anos de idade. O prazer é tão grande que a criancinha diz ‘não’ para tudo, todos e para qualquer pergunta.
Quando emitimos palavras, gastamos energia vital. Já reparou o seu cansaço depois de falar muito? Experimente buscar falar menos, muito do que diz é dispensável, bobagens, inutilidades. Exercite falar apenas o essencial. Economize energia.
Lembro da minha bisavó, aos 91 anos, de xale aos ombros e botas que pareciam coturnos. Na ocasião, eu tinha 6 anos, sentada ao lado dela no sofá, me intrigava com o silêncio: “Vó, por que você não fala?” “Menina, quem muito fala, muito erra”. Uma sabedoria consolidada pelo seu tempo de vida. Meu sogro faleceu aos 95 anos e sempre dizia enfático: “Quem fala muito, dá bom dia pra cavalo”. Ambas as colocações sugerem moderação, sublinham a importância da parcimônia com as palavras. Então, meu amigo, quando na dúvida simplesmente use o silêncio.
* Humbelina Gurgel – Psicóloga e Escritora macaense. Email: h_belina@hotmail.com