OPINIÃO

“O tempo urge”.

“O tempo voa”.

“O ano mal começou e já está acabando”.

“Não tenho tempo pra nada”.

Expressões como estas — e poderia citar centenas delas — já fazem parte do nosso cotidiano. E a cada dia, mês ou ano, elas se fazem mais concretas e frequentes na nossa paranoica vida moderna.

Demasiadamente ansioso, eu nunca esperei a data de vencimento das contas. Aluguéis, contas de luz, gás ou telefone, sempre efetuei os pagamentos tão logo os boletos eram apresentados. Sempre cheguei aos aeroportos ou estações rodoviárias com pelo menos duas horas de antecedência. Dentistas, médicos ou exames outros, sempre mofei nas salas de espera por chegar antes do horário marcado. Era escravo dos relógios, datas e cronogramas. Os exemplos são vários e semelhantes. Eu sabia que aquele comportamento era um transtorno e me fazia infeliz, mas era indomável e muito maior do que o meu controle emocional.

Mas eis que um belo dia… Sempre há um belo dia e temos que estar atentos para vê-lo, entendê-lo e aprender o que ele nos mostra e ensina.
O meu belo dia chegou num sábado de outono, clima ameno para um velho preguiçoso ficar na varanda pensando besteiras e olhando o mundo. Quando ele chegou, eu estava, como sempre fazia nos ócios vespertinos, na varanda do nosso apartamento e comecei a observar as plantas cultivadas há anos, com muito carinho, por minha mulher. Eu sempre olhava aquelas plantas. Olhava, mas não as via. Naquele momento eu comecei a vê-las.

Foi então me dei conta de que aquelas plantas, como todos os vegetais, não tinham a menor preocupação com o tempo. Após serem plantadas, elas brotavam no tempo certo, cresciam numa velocidade predeterminada e, do mesmo modo, floresciam ou florescerão quando for passado o prazo necessário. Sem angústias, sem reclamações, elas me ensinaram que, como dizia Augusto Matraga, “tudo tem a sua hora e a sua vez”.

A partir daquele momento, comecei a mudar meu comportamento e controlar a minhas inquietações. Passei a aceitar o tempo das coisas, dos processos e principalmente das gentes. A entender, e acatar, que cada pessoa tem seus próprios tempos. Se não deu tempo, é porque precisava de mais tempo. Se terminou antes, foi porque precisou de menos tempo. Para realizar uma mesma tarefa, com a mesma qualidade final, as diversas pessoas gastarão diferentes tempos.

O Natal vai chegar sempre no 24 de dezembro, o 29 de fevereiro virá a cada quatro anos, as marés altas ocorrerão duas vezes por dia, o e as torcidas de futebol sempre xingarão as mães dos juízes. Não há como mudar. Melhor aceitar, e respeitar.

Livre das angústias das horas, dos dias, dos meses e anos estou aprendendo rapidamente a ser feliz, até porque o tempo para mim, já usuário de prioridades etárias, é uma coisa que a cada dia vai ficando menor.

Demorei muitos anos para perceber, mas realmente fica mais leve e gostoso viver seguindo a sabedoria dos vegetais e respeitando os tempos das pessoas.

Às favas com os boletos.

Por: Alfeu Valença
Ex-presidente da Petrobrás e fundador da CONPET Consultoria e Engenharia de Petróleo.
Alfeu assina a coluna no site https://temporealrj.com/alfeu/