Desembargadora argumenta que serviço de segurança deve ser remunerado através dos impostos. Em 2021, o DIÁRIO DO RIO realizou uma reportagem especial divulgando que taxas e contribuições não estavam sendo destinadas ao Corpo de Bombeiros

Em 2021, o DIÁRIO DO RIO montou uma reportagem especial sobre a cobrança na Taxa de Incêndio no Rio de Janeiro. E, após dois anos, o assunto volta a tona mais uma vez, pois, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), por meio da 19ª Câmara de Direito Privado, classificou como inconstitucional a cobrança da Taxa de Incêndio a proprietários de imóveis residenciais e comerciais.

Em uma decisão contra a cobrança, a desembargadora relatora Leila Albuquerque argumentou, baseada em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de março de 2021, que a cobrança da Taxa de Incêndio era inconstitucional porque o serviço de segurança em questão deveria ser remunerado por impostos.

Assim sendo, não se desconhecendo da decisão do Órgão Especial e da existência de julgados deste Tribunal de Justiça em sentido contrário, o Supremo Tribunal Federal já pacificou a matéria quanto a inconstitucionalidade da cobrança de taxa de incêndio, eis que se trata de serviço público que deve ser remunerado por imposto”, alega Albuquerque em decisão que suspendeu a cobrança da taxa de Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense.

Relembrando

Em agosto de 2020, como mostra a reportagem especial do DIÁRIO DO RIO, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou que a taxa seria inconstitucional. A jurisprudência do Supremo considerou que o combate a incêndios é um serviço público geral e não pode ser exigido o pagamento de uma taxa com esta finalidade.

Segundo o relator da ADI, ministro Marco Aurélio Mello, é impróprio que, com o pretexto de prevenir eventual sinistro relativo a incêndio, o Estado crie um tributo sob o rótulo taxa, “ausente exercício do poder de polícia ou a utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à disposição”.

E esta não é a primeira decisão neste sentido. Reiteradas e repetidas decisões do Supremo Tribunal Federal consideram a taxa de incêndio, da forma que é cobrada, ilegal. O próprio Ministro Marco Aurélio já havia se manifestado dessa maneira três anos antes, em 2017, ao decidir sobre o Recurso Extraordinário 643.247, do estado de São Paulo.

Em 2019, a ministra Carmem Lúcia também teve o mesmo entendimento sobre a cobrança da taxa em Sergipe, na ADI 2908.

“A segurança pública é dever do Estado, e é disponibilizada de forma geral e indivisível para a garantia da ordem pública e para preservação da incolumidade das pessoas e do patrimônio”, decidiu a ministra na época. “Tratando-se de atividades específicas do Corpo de Bombeiros Militar, o combate a incêndio e a realização de salvamentos e resgates não podem ser custeados pela cobrança de taxas”, concluiu a ministra.

Corpo de Bombeiros e o uso da taxa

Na época, o DIÁRIO DO RIO entrou em contato com o Corpo de Bombeiros do Rio, que afirmou que segue atuando com base na lei estadual que institui a cobrança da taxa. Confira a nota enviada:

“O CBMERJ atua baseado na constitucionalidade da lei que instituiu a cobrança do tributo, cuja arrecadação mantém, em nível de excelência, o serviço prestado à sociedade fluminense. Capacitação dos militares, viaturas e equipamentos de última geração estão entre os benefícios gerados pela Taxa de Incêndio, cujo valor varia de acordo com finalidade e a metragem da edificação”.

Todavia, não é isso que estava acontendo em 2021, segundo o Ministério Público. Uma ação civil pública ajuizada pelo MP, em 2021, informou que as receitas vinculadas ao Funesbom, em especial as decorrentes das taxas e contribuições da corporação, estavam sendo transferidas para a Conta Única do Tesouro Estadual (CUTE), ou seja, não estariam sendo destinadas ao Corpo de Bombeiros.

Trocando em miúdos, apenas em 2019, ou seja, em um único ano, o Funesbom teria acumulado R$ 340 milhões em recursos, valor que chegaria a ultrapassar todo o orçamento previsto na Lei Orçamentária Anual para o fundo (318 milhões), e que não foi aplicado no combate a incêndios e nem beneficiou de nenhuma forma os bombeiros do estado. Segundo o Ministério Público, teria havido vontade específica de não utilizar os recursos de que a corporação precisava, o que resultou neste acúmulo ilegal e ilegítimo de recursos financeiros, durante anos. Ou seja, além de ser ilegal e inconstitucional, a taxa de incêndio no Rio sequer é utilizada para a finalidade que é cobrada.

O que diz o Governo do Estado

Em nota, a Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE) explicou que, em outras ocasiões, o órgão especial do TJRJ já havia reconhecido a constitucionalidade da cobrança e que ela é legal.

A PGE ressaltou ainda que o julgamento do STF citado na decisão não compromete a legitimidade da cobrança já que os casos analisados envolviam outros estados do país, que calculam a Taxa de Incêndio usando métricas diferentes em relação ao Rio de Janeiro.

Os valores da Taxa de Incêndio cobrada no RJ variam de R$ 38,46 a R$ 2.307,03, de acordo com a metragem do imóvel e sua destinação (residencial ou comercial). Não há cobrança para casas de até 50m².

Leia nota na íntegra

“O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio reconheceu, por mais de uma vez, em 2021 e 2022, a constitucionalidade da taxa no Estado do Rio de Janeiro.

Nos processos julgados pelo STF, estavam em análise cobranças instituídas por outros Estados, com características distintas da taxa do Estado do Rio de Janeiro. As decisões daqueles casos não se aplicam à legislação fluminense.

O julgamento do caso específico mencionado também não compromete a cobrança da taxa.”

Por site Diário do Rio