Vivemos tempos difíceis e complexos. Com a chegada do Ecovid 19 no Brasil, muitas incertezas nos tocam. Milhões de pessoas sendo tocadas, quer seja pelas incertezas na manutenção do trabalho, quer seja por sua perda. As perdas que já se somam com os milhares de mortes. Perdas irreparáveis.

Tenho acompanhado alguns dos fenômenos que estão sendo produzidos na subjetividade das pessoas que tenho contato semanalmente e, com efeito, pelas notícias da mídia. Muitas pessoas sofrendo com a questão do isolamento social.

Um dos fenômenos que tenho acompanhado é o do sofrimento devido à experiência de que “os dias parecem os mesmos”. Escutei isso de várias pessoas. “Temos passado por feriados, mas, nem parece feriado… os dias são muito parecidos”. Muitas destas pessoas desejam sair, mas, preferem não arriscar.

Em diálogos com elas, tenho percebido que elas sentem viver num “eterno presente”. “Parece que o tempo não passa…”, afirmam. O sentimento de angústia, de ansiedade, de uma apreensão diante do dia que começa, são alguns dos ‘sintomas’ desta experiência.
Fica claro que o fato de iniciar mais um dia, acordando para mais um dia, faz estar diante da vida, mais uma vez. No entanto, uma vida que é sentida subjetivamente como “parece que é o mesmo dia… todos os dias”. Muitas destas pessoas sofrem de uma aversão ao dia que se inicia, pois, o sentimento no corpo e as imagens e pensamentos são a de um dia que se repetirá.

A relação com o espaço de casa se tornando repetitiva, produz uma certa aversão, um certo incômodo com os espaços vividos da casa. Isto decorre do fato de que o corpo-mente, ou seja, os modos de sentir, pensar e estar no ambiente estão restritos a um mesmo espaço. Desta forma, temos como efeito desta relação com o espaço onde o isolamento social é feito, uma Topofobia (topos, do grego, significando ‘lugar’; fobia, do grego Fobos, tendo o sentido de ‘aversão, medo’. A palavra topofobia significa uma aversão ou ‘medo’ de um determinado lugar. No caso das experiências de isolamento social, temos a expressão na subjetividade de muitas pessoas de uma ‘certa aversão’ ao espaço vivido e sentido como ‘sempre igual’. A experiência subjetiva é a de que o espaço não se transforma. A experiência vivida é a de um espaço estático.

Por sua vez, o tempo não parece passar. A experiência vivida no plano temporal é a de um ‘eterno presente’. O afeto é o de um tempo que não flui, não corre, não se transforma. A experiência vivida e sentida é a de um tempo estático. Poderemos utilizar a expressão ‘cronofobia’ para designar esta ‘aversão’ ao tempo que não passa, ou seja, ao tempo que se cristalizou num eterno presente. A palavra cronofobia também é utilizada nas experiências onde as pessoas que passaram pelo isolamento e que, ao momento de voltarem aos contatos externo, sentem o desconforto com o tempo que passa a fluir, com as transformações que, mais uma vez, tocam a sua vida.

Em diálogos com inúmeras pessoas que passam pelo isolamento social e que não saem de casa, temos trabalhado sobre a construção de repertórios de vida onde a experiência da ‘topofilia’, ou seja, do amor e do prazer de estar num ambiente possa, mais uma vez, ganhar vida em suas vidas! A partir do fato de poderem se encontrar com situações simples, como ler um livro, fazer ginástica, conversar com alguém, mesmo que seja a distância, observar aquilo que, no dia a dia costumeiro da vida considerada ‘normal’, passa por despercebido.

Este amor e prazer na relação com ambiente vivido pode ser construído, de pouco a pouco, sobretudo, quando buscamos os caminhos da simplicidade, fazendo contato com atos que possam alimentar a nossa subjetividade, a nossa alma. Uma busca na relação com aquilo que é pequenino e quase sem valor para uma sociedade que só valoriza os bens materiais e grandes feitos! Uma busca que pode transformar as lentes de ver a vida a cada dia. Uma busca que pode trazer os movimentos do tempo, na medida em que a percepção da vida saia daquilo que falta, para se valorizar, aquilo que está aqui-e-agora, diante de nós e que está disponível para nós.

A experiência da topofilia e de uma cronofilia pode ser construída. Experiência onde passamos a nos transformar com a vida que está diante de nós. Um amor ao espaço de vida que possuímos. Um amor e a valorização do tempo de vida que se abre a cada dia, mais uma vez, para todos nós.
Sinta, pense… reflita!

Abraço afetivo,
Paulo-de-Tarso