Presidente do Conselho de Usuários, Sylvie D'Apote, diz que a busca é pela aproximação com transportadores (Foto: Steferson Faria)

Criado para monitorar as transportadoras, conselho mira debate sobre contratos menos punitivos e transparência das tarifas, dentre outros tópicos

 Conselho de Usuários de gasodutos define a agenda prioritária, para os seus primeiros passos. Carregadores buscam aproximação com transportadoras, para tratar de aperfeiçoamentos na oferta de capacidade e flexibilização de contratos. Em paralelo, querem passar a lupa sobre as tarifas.

Petrobras fecha contrato de afretamento de navio regaseificador e prepara retomada do terminal de GNL da Bahia. Eneva mira produção de gás na Bacia do Paraná, para fornecimento para fertilizantes e mais. Confira:


A AGENDA DOS CARREGADORES 

Com a sua governança devidamente aprovada pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o Conselho de Usuários de gasodutos, criado para monitorar as transportadoras, definiu uma agenda prioritária para seus primeiros passos.

Na ordem do dia, estão debates como ajustes na plataforma virtual de contratação de capacidade e a padronização dos contratos de transporte e flexibilização de cláusulas de penalidades.

Em paralelo, o Conselho quer se preparar para discussões mais amplas e complexas, como a revisão da Base Regulatória de Ativos (BRA) dos gasodutos e o código comum de redes (as regras de harmonização do sistema entre as diferentes transportadoras).

A seguir, a presidente do Conselho, Sylvie D’Apote (IBP), e o vice-presidente, Adrianno Lorenzon (Abrace), navegam pelos principais temas da agenda prioritária do grupo.

Mas antes, relembrando… A criação do Conselho de Usuários Representante dos Carregadores de Gás Natural está prevista na Nova Lei do Gás, para atuar na defesa dos interesses dos carregadores (aqueles que contratam a capacidade de transporte nos gasodutos).

A legislação atribuiu à ANP a função de aprovar a estrutura de governança do grupo – o que foi feito no fim de agosto.

O Conselho será composto, a princípio, por seis entidades representantes de diferentes elos da cadeia de gás: Abep/IBP (produtores); Abpip (produtores independentes), Abrace (grandes consumidores), Abraceel (comercializadores); Abraget (termelétricas) e Abegás (distribuidoras de gás canalizado).

As decisões do Conselho são tomadas pelas associações, em colegiado. Em caso de dissenso, entra em jogo o Comitê de Carregadores – formado, hoje, por Bahiagás, SCGás e Sulgás (distribuidoras), Equinor, Galp, Origem, Petrobras, PetroReconcavo e Shell (produtores) e Proquigel (consumidor livre).

Cabe ao Comitê assessorar o Colegiado de Associações na tomada de decisão em caso de dissenso; e sugerir temas para deliberação.



CONTRATOS PADRONIZADOS D’Apote conta que o Conselho de Usuários acredita num trabalho de aproximação com as transportadoras:

“A tendência é que falemos primeiro com as transportadoras, para que só depois, se necessário, nos posicionemos perante a ANP. Idealmente é essa a interação”, afirma.

A presidente do grupo destaca que um dos primeiros pleitos apresentados pelos carregadores aos transportadores foi a necessidade de aprimoramentos no POC (o Portal de Oferta de Capacidade, plataforma única que permite aos clientes negociarem contratos com transportadoras diferentes, num só marketplace); e nos contratos de transporte em si.

As transportadoras discutem entre si, não de hoje, a padronização de seus contratos. E o Conselho de Usuários espera apresentar, ainda este mês, propostas sobre o assunto. Uma nota técnica está sendo fechada nesse sentido.


E TAMBÉM MENOS PUNITIVOS Os carregadores veem uma oportunidade de discutir um assunto paralelo: a flexibilização de algumas penalidades previstas nos contratos de transporte – como os encargos de excedentes (aquilo que é cobrado do carregador quando o volume injetado supera as quantidades diárias contratadas) e o encargo de capacidade não autorizada.

Adrianno Lorenzon conta que, nos últimos anos, houve um amadurecimento da abertura do mercado, mas que isso ainda não está totalmente refletido nas cláusulas contratuais.

“As transportadoras enxergavam mais riscos no início da abertura e isso se refletia nas penalidades. Elas vêm reduzindo, mas ainda há espaço para mais flexibilização”, comenta.

D’Apote cita que uma outra agenda que influencia nas penalidades – e que os carregadores esperam avançar no debate com as autoridades do setor de gás e de energia – é o prazo de nomeação dos gasodutos (confirmação, de véspera, da capacidade a ser utilizada no dia seguinte) para termelétricas.

Ela explica que as geradoras precisam confirmar com as transportadoras a capacidade a ser utilizada antes mesmo de saberem se serão despachadas ou não (e em que nível) pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

“Nessa reunião de diferentes associações, no Conselho, a gente começa a entender a dor do outro”, afirma, em referência ao pleito da Abraget abraçado pelos demais elos no debate.


OS CÓDIGOS DE REDE Um outro tema que deve começar a ganhar espaço no debate entre carregadores e transportadores é o da definição dos códigos comuns de rede — conjunto de regras de balanceamento da rede; descongestionamento; repasse de receitas e informações entre os diferentes transportadores que operam num mesmo sistema.

Lorenzon conta que a ideia do Conselho é ser atuante na estruturação dessas regras, buscando um diálogo prévio com os transportadores antes que o tema seja levado à aprovação da ANP.

“Gostaríamos, em 2024, de trabalhar de forma mais próxima das transportadoras para entregar algo mais arredondado para a ANP”, afirma.

ATGás, representante das transportadoras, prevê iniciar ainda este ano a conversa com o Conselho sobre o código comum. Ele afirma também que aproximação com os carregadores já tem dado alguns primeiros frutos, na harmonização dos contratos.

O presidente da associação, Rogério Manso, cita que o diálogo com os carregadores é positivo para o aprimoramento do mercado. “Mas estamos numa maratona regulatória, não é um sprint”, comentou, ao se referir sobre o ritmo das mudanças do mercado.

Manso acredita que o caminho natural da aproximação entre o Conselho de Usuários e transportadoras será a definição, no futuro, de indicadores e metas para monitoramento do serviço.


OLHO NA REVISÃO TARIFÁRIA D’Apote também cita a preocupação com o debate sobre a revisão da BRA dos gasodutos. É um primeiro passo para uma revisão tarifária.

A Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) passou por uma revisão da BRA entre 2019/2020.

A executiva lembra que, no fim de 2025, começam a vencer os contratos legados da Nova Transportadora do Sudeste (NTS) e Transportadora Associada de Gás (TAG) – aqueles assinados com a Petrobras antes da privatização das transportadoras e que foram herdados pelos novos operadores do setor.

E o Conselho quer começar, desde já, a pautar o assunto: “Queremos ter tempo suficiente para não fazermos a coisa atrapalhada. A maior lição aprendida da revisão da base da TBG é que é uma coisa muito complexa”, disse a presidente da entidade.

Monitorar e discutir as tarifas de transporte está no DNA do Conselho de Usuários, de acordo com o estatuto da entidade (ver na íntegra, em .pdf).


E POR FALAR EM TARIFAS… A ANP abriu este mês uma consulta pública sobre as propostas tarifárias da TAG, TBG e TSB (a Transportadora Sulbrasileira de Gás) para os contratos de 2024 a 2028.

Seria, em tese, uma primeira grande oportunidade para que o Conselho de Usuários exercesse uma de suas principais atribuições.

Mas… o grupo considerou curto o prazo de 15 dias estabelecido pela ANP para o recebimento de contribuições (com um feriado no meio), dada a complexidade da discussão, e não conseguiu fechar uma posição sobre o assunto.

Alguns agentes (Abegás, Sulgás e Abiquim dentre eles) chegaram a solicitar a ampliação dos prazos para se posicionar. O pedido não foi acatado pela ANP e as associações que integram o Conselho acabaram, então, apresentando suas próprias contribuições para o debate, de forma independente.

Mas foi uma oportunidade perdida”, comentou D’Apote, ao se referir sobre a expectativa do grupo de começar a discutir, coletivamente, com mais profundidade, as propostas tarifárias.

D’Apote e Lorenzon preferiram não detalhar as contribuições do IBP e Abrace, respectivamente, por terem concedido a entrevista como porta–vozes do Conselho.

“A condução desse processo foi ruim. E quem acaba perdendo é o mercado, que tanto pede por um gás competitivo”, complementou o diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, Marcelo Mendonça, em entrevista à epbr esta semana.

O rito: a ANP solicitou às transportadoras que operam no Brasil suas respectivas propostas tarifárias, relativas ao processo de oferta de capacidade disponível para os anos de 2024 a 2028. São contratos de transporte anuais na modalidade firme.

A ANP justificou o prazo curto de consulta pública, dado o cronograma apertado para a conclusão da oferta de capacidade a tempo de que a contratação ocorra ainda em 2023 – possibilitando, assim, a assinatura de contratos firmes, no lugar dos atuais extraordinários, para 2024.

Procurada, a ANP não se manifestou até o fechamento desta edição. O espaço segue aberto.


AUSÊNCIA SENTIDA Houve também um estranhamento sobre a ausência da proposta tarifária da NTS – que, segundo a ANP, apresentou sua proposta com “pendências relevantes” e, por isso, não foi incluída na consulta.

A agência justificou, na ocasião da abertura da consulta pública, que faltavam requisitos mínimos, tais como a proposta tarifária para 2025; o desconto do saldo da conta regulatória sobre as Receitas Máximas Permitidas; e a incorporação das receitas do gasoduto Itaboraí-Guapimirim (Gasig).

Questionada, a NTS respondeu que já entregou toda documentação necessária para a ANP, que cumpriu todos os prazos estabelecidos e que “segue em tratativas tarifárias com o órgão regulador”, em ações que são “normais na relação entre as partes”.

“A NTS enfatiza que cumpre rigorosamente a legislação e as normas regulatórias vigentes da ANP, MME e EPE e reitera seu compromisso com a ampliação da malha de transporte e o abastecimento de gás do país”, completou.


GÁS NA SEMANA

Brookfield planeja vender controle da NTS. Empresa espera concluir a venda do ativo no 1º semestre de 2024, embora os participantes do mercado alertem que o cenário para uma transação de M&A é desafiador em meio ao cenário global de altas taxas de juros e aos conflitos atuais na Europa e no Oriente Médio. (bnamericas)

Petrobras prepara retomada do terminal de GNL da Bahia. Estatal fechou novo contrato para afretamento do FSRU Sequoia, da Excelerate. O navio regaseificador será afretado por dez anos, a partir de janeiro de 2024 – quando a posse do terminal de regás da Baía de Todos os Santos retorna para a Petrobras, após término do arrendamento do ativo para a própria Excelerate.

GNL small-scale e fertilizantes na pauta com Bolívia. Representantes da Petrobras iniciaram nesta sexta (20/10) uma rodada de negociações com autoridades bolivianas para discutir possíveis investimentos em gás, lítio e renováveis no país vizinho. Na pauta, exploração e produção, GNL em pequena escala e investimentos no complexo de amônia e ureia de Puerto Quijarro.

Eneva mira produção de gás para fertilizantes no Centro-Oeste. Empresa vê perspectiva para a produção de gás na Bacia do Paraná, onde adquiriu quatro blocos na Oferta Permanente da ANP de 2020. Os blocos estão localizados no MS e GO. A previsão é começar a perfuração em 2025, tendo em vista o fornecimento para eventuais projetos de produção de fertilizantes na região.