Nesta quarta-feira, 10 de junho, retornará à pauta de votação na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o Projeto de Lei nº 1771/19, que trata da internalização do Convênio Confaz nº 03/2018. Esse convênio regula diversas desonerações e não incidências tributárias para a indústria do petróleo, ao mesmo tempo que exige contrapartidas dos investidores – regras já internalizadas no Estado do Rio de Janeiro pelo Decreto nº 46.233/18.
A ideia inicial do PL 1771 era preservar os termos do Convênio 03/18. Essa iniciativa assegurava status de Lei interna para o Convênio, gerando mais segurança jurídica, em especial ratificando a alíquota de 3% de ICMS na importação sobre os equipamentos inseridos no contexto do já famoso Repetro. Mas a iniciativa tornou-se questionável quando sobrevieram emendas ao PL 1771, que alteram essa dinâmica e estabelece alíquotas diferentes, notadamente a alíquota majorada de 3% para 18% de ICMS nas importações no âmbito do Repetro.
É verdadeira ducha de água fria nos direitos dos investidores, que planejaram investimentos pesados, de longo prazo, considerando a moldura tributária desenhada pelos governos Federal e Estaduais, para as operações de exploração e produção de óleo e gás – moldura essa válida até 2040 pelo menos.
Chama a atenção que a Alerj pretenda alterar radicalmente os termos de Convênio já internalizado há mais de 2 anos, sem que tenha havido qualquer alteração jurídica no ambiente de investimento. Parece que a pretensão é exclusivamente financeira, mas que não tem qualquer base na Constituição e nas Leis.
A indústria do petróleo tem sido forçada a combater iniciativas inconstitucionais baixadas nos últimos anos pela Alerj – diversos intentos foram reiteradamente rechaçados pelos Tribunais do país – dentre elas, taxas de exploração de óleo e gás (a denominada TFPG) e normas de cobrança de ICMS na extração (a denominada Lei Noel).
É preciso exortar o cumprimento da Constituição e das leis do país, garantindo um ambiente saudável para o investidor no Estado do Rio de Janeiro. Não há incentivos apropriados para investimentos em ambientes de insegurança regulatória, fiscal e arcabouço normativo demasiadamente complexo.
Relembremos os resultados decepcionantes das últimas rodadas de licitação de blocos de exploração e produção de óleo e gás.
Saltam aos olhos diversos vícios no PL 1771, conforme alterado pelas emendas. O primeiro e mais evidente é que os contribuintes foram obrigados a implementar contrapartidas financeiras relevantes como forma de aderir aos termos do Convênio 3/18, o que torna inviável que a Alerj pretenda alterar as desonerações previamente pactuadas.
Em atenção ao primado da segurança jurídica do investidor, a Legislação Brasileira não permite que se alterem os incentivos fiscais concedidos sob condição onerosa e por longo prazo, conforme o artigo 178 do Código Tributário Nacional, sacramentado pela Súmula 544 do Supremo Tribunal Federal. No mais, depois que um Estado celebra um Convênio não pode internalizá-lo de modo parcial, tampouco alterá-lo. A iniciativa da Alerj vai de encontro a conceitos doutrinários e jurisprudenciais clássicos a esse respeito.
A intempestividade da iniciativa também fica evidente quando se observa que não mais é possível a denúncia do Convênio 3/18, já que ele foi internalizado pelo Decreto nº 46.233/18, e já transcorreram os prazos para se considerar perfectibilizado e ratificado (art. 4º da Lei Complementar 25/75). Alterar a carga tributária e mudar as regras do jogo em um momento especialmente sensível para a indústria de óleo e gás é, além de ilegal, é um anúncio de que o Estado do Rio de Janeiro não cumpre com seus acordos e não pode garantir um ambiente de negócios juridicamente estável.
Nunca é demais esclarecer que são falsas as premissas de que, em geral, projetos do pré-sal têm risco exploratório “próximo a zero”, ou custos de exploração baixíssimos, o que vem justificando ímpetos arrecadatórios (legais e ilegais) por governos e parlamentares.
Em ambiente de profunda recessão global, reiteradas crises do setor petrolífero, com expectativas cada vez mais realistas de preço do barril baixo durante longo período — sem mencionar a acelerada transição energética para fontes de baixo carbono — vários projetos do pós e pré-sal fluminense serão inviabilizados com alíquotas de ICMS majoradas para importação de bens e equipamentos, e, se isso ocorrer, não há dúvidas que investidores deixarão o Estado do Rio, que é tão dependente do mesmo setor que as recentes emendas ao PL 1771 pretendem prejudicar.