O Silêncio e sua infinita magia. Entrar no silêncio para mergulhar na experiência de uma temporalidade infinita. Encontrar-se no silêncio é despir-se da necessidade de sempre ocupar o espaço com alguma palavra. O silêncio nos convida a encontrarmo-nos com a superfície profunda de ser. Poder ser de tantas maneiras o quanto pudermos, inspirando-nos da proposição de Fernando Pessoa que nos propõe sentir a vida de tantas maneiras o quanto for possível.

Sentir o silêncio é SER o próprio silêncio. Passamos a escutar a vida, acompanhando os seus movimentos. O silêncio é o risco da voz que se emudece, inspirando-nos de Lyotard. O silêncio passa a ser ativo. O silêncio passa a ser a força afetiva que nos toca, tocando o mundo, percebendo-o. A consciência sensível e orientada ao silêncio nos mergulha no pensar sem palavras. Passamos a pensar por sensações. Passamos a Ser as sensações. Somos o puro devir. Ouvimos a vida sem precisar ocupar o espaço com sonoridades… mas, o silêncio é pura musicalidade. O silêncio é a pausa necessária que nos faz perceber os intervalos entre um som e outro.

Sem o silêncio a vida seria uma nota melódica que se estende ao infinito… mas, o silêncio nos mergulha no infinito de nós mesmos, nos faz sentir o infinito do mundo.
Sentir o silêncio é nascer a cada instante no tempo que passa. O silêncio nos faz perceber coisas que são impossíveis de serem percebidas… nós ocupamos demais o espaço com muitas palavras… as palavras nos impedem de sentir, assim nos ensina a filosofia taoísta. Sentir o silêncio é se lançar ao imprevisto, é se lançar às dissonâncias do tempo que passa. O silêncio é o útero d’onde podemos nascer de nós mesmos.

É preciso ser corajoso para entrar no infinito do silêncio. Será poder sentir uma forma de solidão que nos mergulha ao encontro das nossas inúmeras formas de ser. Passamos a nos integrar à natureza. Passamos a ser a natureza, pois é no silêncio que podemos entrar em contato com as nossas tantas partes, as nossas tantas formas de sentir. O silêncio não é o vazio. O silêncio é um ato de presença ao mundo.

Assim, podemos sentir a luminosidade que toca os nossos olhos quando nos colocamos em silêncio… passamos a sentir a vida mais de perto, pois, nos distanciamos dela quando nos ocupamos com tantas coisas, com tantas ocupações, com tantas palavras… Perguntaria: quais foram as palavras mais importantes que você expressou para alguém no seu dia? Como seria desenvolvermos uma ‘economia da palavra’? Como seria poder sentir, poder estar num contato pleno consigo, com o outro e com o mundo para poder expressar as palavras mais significativas, mais tocantes? No entanto, precisamos preencher nossos contatos com milhares de palavras inúteis.

Tagarelamos, tagarelamos, tagarelamos. Por vezes, não damos tempo, não damos pausas para escutar o outro. Não vivemos numa cultura das pausas. Dar pausas é perder tempo. Dar pausas para sentir o outro será ser ‘passivo’, conforme a lógica de uma sociedade da performance. É preciso ser rápido. O que angustia é sentir a lentidão da vida. É preciso se dizer logo o que se pensa. Isto não é pensar. Isto é falar por reflexo… Não vivemos numa sociedade da reflexão, conforme Paul Virilio. É preciso reagir rapidamente… não há tempo para sentir, para pensar por sensações, pensar através do corpo… pois, o corpo já pensa por sensações, conforme Spinoza.

A musicalidade do silêncio ganha a sua grande potência quando passamos a não reagir às palavras do outro. Passamos a ser as pausas da música do instante. Música nascida do encontro com o outro. A musicalidade do silêncio só é possível quando estamos em pleno contato com o que acontece aqui-e-agora. O silêncio fala. Ele pode falar mais que um milhão de palavras. Pois, é na musicalidade do silêncio que podemos tocar o outro com o nosso olhar que o penetra, tocando mundos que, ele mesmo, desconhece. A sensibilidade do silêncio é uma arte.

Para além da passividade, o silêncio passa a ser pura atividade! O silêncio passa a ser o sopro necessário de vida para que, no bom momento, as palavras necessárias possam sair de nossa boca. O silêncio se faz para abocanhar o bom instante de se dizer algo que é provido de sentido… será entrar no bom tempo, na boa ocasião, no momento oportuno, no tempo de Kairós.

Sinta, viva, cante com a musicalidade do silêncio… sem uma só palavra.

Abrace o silêncio que te abraça,
Abrace a vida em silêncio,
Paulo-de-Tarso