Notícia-crime foi protocolada no Supremo Tribunal Federal
O presidente Jair Bolsonaro protocolou uma notícia-crime contra o ministro Alexandre de Moraes por suposto abuso de autoridade na condução do inquérito das Fake News. a ação vai ser reladata pelo ministro Dias Toffolli.
No texto referendado pelo advogado Eduardo Magalhães, Bolsonaro lista os motivos pelos quais acredita que as ações de Moraes no inquérito é criminosa. Leia abaixo na íntegra:
“JAIR MESSIAS BOLSONARO, brasileiro, casado, Presidente da República, inscrito no CPF sob o nº 453.178.287-91, com domicílio na praça dos Três Poderes, Brasília/DF, por seu advogado (doc.1), vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, com fundamento no que dispõem o art. 5º, incisos XXXIV, alínea “a”, e XXXV, da Constituição da República, e o art. 5º, inciso II, do Código de Processo Penal, apresentar NOTÍCIA-CRIME, em face do Exmo. Min. ALEXANDRE DE MORAES, brasileiro, casado, Ministro do Supremo Tribunal Federal, portador do RG nº 1.422.621-09, inscrito no CPF sob n° 112.092.608-40, com endereço profissional no Supremo Tribunal Federal, praça dos Três Poderes, Brasília/DF, pelos fatos a seguir expostos.
“- 1 – Histórico processual
“1. Como é de amplo conhecimento, no dia 14.03.19, o então Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal editou a Portaria nº 69 (doc.2) e, por meio desta, determinou a instauração de Inquérito para apurar supostas (1) disseminações de fake news, (2) de denúncias caluniosas, (3) ameaças e outras infrações que, em tese, atingiriam a honra e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares. Na mesma oportunidade, o então Ministro Presidente do Pretório Excelso designou o Exmo. Min. Alexandre de Moraes, ora Noticiado, para conduzir o Inquérito requisitado, o qual foi instaurado sob o nº 4.781 (fake news). Na sequência, no dia 19.03.19, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes exarou despacho inicial designando o Delegado de Polícia Federal Alberto Ferreira Neto e o Delegado de Polícia Civil Maurício Martins da Silva para auxiliarem nas investigações, bem como a servidora Cristina Yukiko Kusahara para secretariar os trabalhos.
“2. Em seguida, pelo que se extrai do Apenso nº 70 do referido Inquérito n° 4.781 (fake news), única parcela dos autos disponibilizada às defesas, foram produzidos, pelo menos, três laudos de análise sobre os fatos investigados. O primeiro relatório, datado de 28.02.20 e denominado “Laudo de análise de ataques pela rede social Twitter ao STF e seus membros”, tem como objeto a suposta conexão entre diversos perfis críticos ao Supremo Tribunal Federal. O segundo relatório, datado de 28.04.20 e denominado “Relatório de pesquisa pelas redes sociais Facebook e Twitter”, tem como objeto a análise dos supostos ataques ao próprio ora Noticiado, por meio dos perfis da Deputada Federal Carla Zambelli. E o terceiro relatório, datado de 28.04.20 e denominado “Relatório de pesquisa na rede social Twitter”, também tem como objeto supostos ataques ao próprio Exmo. Min. Alexandre de Moraes, mas desta vez veiculados no perfil da Deputada Federal Bia Kicis.
“3. Dando continuidade à leitura dos autos, no dia 26.05.20, o ora Noticiado, contrariando parecer da Procuradoria-Geral da República apresentado em 19.05.20, atendeu ao pedido do Magistrado Instrutor (pedido este que, frise-se, as defesas também não possuem acesso) e decretou medida de busca e apreensão contra dezesseis investigados. Na mesma decisão, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes determinou a oitiva e o bloqueio integral de contas em redes sociais como Facebook, Twitter e Instagram (medida cautelar inexistente no ordenamento jurídico penal brasileiro) dos mesmos dezesseis investigados. Ainda neste decisum, o ora Noticiado ainda decretou o afastamento do sigilo bancário e fiscal de quatro investigados; a oitiva de oito Deputados Federais e Estaduais; ordenou a expedição de ofício para que as redes sociais preservassem todo o conteúdo das postagens dos oito Parlamentares indicados e determinou, por fim, que a Autoridade Policial designada para atuar no caso elaborasse “laudos periciais necessários que demonstrem eventual prática de infrações penais” e que a rede social Twitter fornecesse a identificação dos usuários @bolsoneas, @patriotas e @taoquei1.
“4. Em seguida à deflagração da operação, a partir do dia 27.05.20, as defesas dos investigados no Inquérito nº 4.781 (fake news) passaram a peticionar nos autos requerendo acesso. No dia 29.05.20, analisando os primeiros pedidos de acesso, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes deferiu vista unicamente do conteúdo do Apenso nº 70 dos autos nº 4.781 (fake news), uma vez que, em tese, somente este Apenso estaria relacionado aos investigados que foram objeto das medidas cautelares probatórias e pessoais. Seguiram-se, então, diversos outros pedidos de acesso à integralidade dos autos (volumes principais e apensos), não se limitando tais pleitos apenas ao Apenso nº 70. No entanto, as decisões proferidas pelo ora Noticiado com relação a tais pedidos de acesso continuaram franqueando vistas para as defesas, inclusive do ora Noticiante, tão somente do Apenso nº 70, sempre sob o mesmo argumento de ser este Apenso a única parcela dos autos correspondente aos investigados.
“5. Vale frisar que, ao todo, entre o primeiro pedido de vistas e a data de hoje, 16.05.22, foram proferidas, ao menos, trinta e seis decisões1 com a mesma negativa de acesso a elementos probatórios já documentados e utilizados como fundamento para imposição de medidas cautelares, pessoais e probatórias, contra os investigados; os quais – até o presente momento – só tiveram acesso ao Apenso nº 70 do Inquérito nº 4.781 (fake news), mas não possuem conhecimento sobre os volumes principais ou demais apensos de tais autos.
“6. É de se dizer que, mesmo diante de reiteradas negativas de acesso a elementos probatórios já documentados nos autos e utilizados como fundamento do ato decisório de 26.05.20, no julgamento da ADPF n° 572 pelo Pretório Excelso, o qual versou sobre a constitucionalidade da Portaria n° 69 do Supremo Tribunal Federal, o ora Noticiado chegou a consignar que “desde o início, os defensores […] tiveram amplo acesso aos elementos de prova já documentados no inquérito” (doc.3). No entanto, a afirmação exarada em julgamento perante o plenário do Pretório Excelso não representa, nem de longe, a real atuação do Exmo. Min. Alexandre de Moraes no referido Inquérito nº 4.781 (fake news). Antes o contrário, porque as defesas – até hoje – não tiveram amplo acesso aos elementos de prova já documentados nos autos.
“7. A corroborar tal assertiva de negativa de acesso, é o tratamento que o ora Noticiado vem conferindo aos pedidos das defesas, formulados no Inquérito conexo nº 4.828 (atos antidemocráticos), para que elas tenham acesso ao ofício nº 452, confeccionado pelo Deputado Federal Nereu Crispim e aviado nos aludidos autos de investigação. Explica-se. O mencionado Parlamentar protocolou junto ao Exmo. Min. Alexandre de Moraes diversos ofícios, ora colacionando fatos novos aos autos, ora requerendo providências no âmbito do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), o qual é conexo ao Inquérito nº 4.781 (fake news), onde tal Parlamentar chegou a ser ouvido como testemunha.
“8. Contudo, tempos mais tarde, o Deputado Federal Nereu Crispim voltou atrás em seus ofícios e em seu depoimento e, por intermédio do ofício nº 452, protocolado no Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), ele disse que havia se equivocado, não acreditando na procedência dos fatos que estavam sendo investigados e que foram objeto de seu depoimento e ofícios anteriores. Logo, trata-se de material amplamente favorável às defesas, com relação ao qual os investigados tomaram conhecimento de sua existência depois de uma entrevista que o Deputado Federal Nereu Crispim deu para canal do YouTube em 17.11.20. Entretanto, até a presente data, mais de um ano depois do protocolo de tal ofício, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes continua negando o acesso das defesas a tal documento, mesmo estando tal ofício documentado nos autos e sendo favorável aos investigados (doc.4).
“9. Portanto, contrariamente ao que foi dito pelo ora Noticiado no julgamento da ADPF nº 572, não há amplo acesso das defesas aos elementos de prova contidos nos autos de Inquérito nº 4.781 (fake news) e no feito conexo Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos). Muito pelo contrário.
“10. Mas há mais. Paralelamente ao Inquérito n° 4.781 (fake news), tramita no Supremo Tribunal Federal o Inquérito n° 4.874 (milícias digitais). Referido procedimento fora instaurado em 16.07.21, a fim de apurar fatos oriundos do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), o qual teria sido supostamente arquivado. Diz-se supostamente porque o que se denota na prática é que o Exmo. Min. Alexandre de Moraes, ao determinar de ofício a abertura do Inquérito nº 4.874 (milícias digitais), objetivou, em verdade, contornar o pedido de arquivamento do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos) realizado pela Procuradoria-Geral da República. Explica-se.
“11. Em 04.06.21, o Ministério Público Federal requereu o arquivamento do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), porque entendeu não existir indícios de autoria e de materialidade com relação aos fatos investigados (doc.5). Em razão do encontro fortuito de provas ocorrido em tal feito, ao mesmo tempo em que a Procuradoria-Geral da República solicitou o arquivamento do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), ela requisitou a abertura de novos inquéritos – perante a Justiça estadual e a Justiça federal de primeiro grau – para que se investigasse os novos fatos descobertos. Contudo, em uma espécie de by-pass processual, e visando contornar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o pedido de arquivamento feito pela Procuradoria-Geral da República é cogente2, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes acatou o pleito de arquivamento e, para investigar os novos fatos descoberto – com relação aos quais o Supremo Tribunal Federal não tem, em princípio, competência –, ele determinou, de ofício, a abertura do Inquérito nº 4.874 (milícias digitais), trasladando para tal feito todas as peças informativas constante do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos) (doc.6). Ou seja, trata-se de novo Inquérito (milícias digitais), mas cujo conteúdo e temas investigados são exatamente os mesmos do Inquérito arquivado (atos antidemocráticos). Por isto é que se fala aqui em by-pass processual.
“12. Ademais, mesmo após o arquivamento de tal feito, o ora Noticiado continuou a se utilizar das peças informativas produzidas no Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos) para fundamentar suas decisões, proferidas tanto no Inquérito nº 4.874 (milícias digitais), quanto no Inquérito 4.781 (fake news). Para exemplificar, pode-se citar o ato decisório proferido pelo Exmo. Min. Alexandre de Moraes no dia 04.08.21, o qual acolheu o requerimento do Tribunal Superior Eleitoral de inclusão do Presidente da República nas investigações do Inquérito nº 4.781 (fake news). Nele, para justificar a introdução do ora Noticiante nos autos, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes afirma que “o material apreendido e analisado no Inquérito 4828 trouxe importantes elementos probatórios a demonstrar uma possível organização criminosa”, sendo que, como fora identificado o mesmo “modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, com o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Poder Judiciário”, seria cabível a instauração de investigação para apurar as condutas do Mandatário Nacional (doc.7). Ou seja, os elementos indiciários arquivados continuaram, mesmo após o fim do Inquérito nº 4.828 (atos antidemocráticos), a produzir efeitos e fundamentar decisões, seja no âmbito do Inquérito nº 4.874 (milícias digitais), seja no âmbito do Inquérito nº 4.781 (fake news).
“13. De qualquer modo, deixando de. lado a questão do by-pass processual, é necessário aqui se pontuar em detalhes o fato atribuído ao ora Noticiante que gerou sua inclusão no Inquérito nº 4.781 (fake news). Conforme já mencionado, após o início do Inquérito nº 4.781 (fake news), em 03.08.21, foi encaminhado ofício do Tribunal Superior Eleitoral ao Exmo. Min. Alexandre de Moraes, noticiando a suposta prática de crime pelo Presidente da República, a qual teria relação com os fatos apurados no referido Inquérito. Tal ofício foi instruído com uma cópia do pronunciamento realizado pelo ora Noticiante, na plataforma YouTube, no dia 29.07.21. Segundo o que interpretou o Tribunal Superior Eleitoral, em tal pronunciamento, o Presidente da República teria incidido em prática delitiva, razão pela qual a sua inclusão no Inquérito nº 4.781 (fake news) seria oportuna.
“14. Na sequência, em 04.08.21, sem sequer ouvir a Procuradoria-Geral da República, a qual só se manifestaria nos autos dias mais tarde, em 10.08.21, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes decidiu acatar o ofício do Tribunal Superior Eleitoral e, por conseguinte, incluir o Presidente da República como investigado no Inquérito nº 4.781 (fake news). O ato do Exmo. Min. Relator do Inquérito em questão foge da liturgia que se espera de um sistema acusatório e desrespeita o teor do art. 3-A do Código de Processo Penal e do art. 230-B do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal3, sobretudo porque o papel de dominus litis recai sobre o Ministério Público Federal e não sobre o Magistrado Relator. Portanto, era imperiosa a colheita de parecer da Procuradoria-Geral da República antes da inclusão do ora Peticionário nos autos de investigação. No entanto, assim não se procedeu.
“15. De outro giro, a inclusão do Presidente da República no Inquérito nº 4.781 (fake news), para o qual o Exmo. Min. Alexandre de Moraes possui prevenção, é igualmente questionável quando se analisa o teor da Portaria nº 69 do Supremo Tribunal Federal, a qual deu origem a tal procedimento investigativo. E isso porque tal Portaria é clara em delimitar o espaço de perquirição do Inquérito nº 4.781 (fake news): supostos ilícitos que tenham como vítima ou o Pretório Excelso ou um de seus integrantes. No entanto, o ofício oriundo do Superior Tribunal Eleitoral trata de um fato que não envolve nem um Ministro do Supremo Tribunal Federal, nem a própria Corte, mas sim o Tribunal Superior Eleitoral e um de seus Ministros. Logo, a fim de se respeitar o conteúdo da Portaria nº 69, o correto teria sido abrir um novo Inquérito – com livre distribuição – para aí sim se começar a apurar os fatos mencionados no ofício oriundo da Corte Eleitoral e não se incluir tais fatos no Inquérito nº 4.781 (fake news), como ocorreu.
“16. De toda sorte, deve-se deitar os olhos sobre os fatos mencionados no ofício do Superior Tribunal Eleitoral, a fim de se compreender a completa falta de justa causa para que o ora Noticiante tivesse sido incluído como investigado em tal feito. Confira-se.
“17. Semanalmente, o Presidente da República realiza uma live em seu canal no YouTube. Os temas comentados envolvem o seu trabalho como Mandatário Nacional, além de diversos assuntos que possam interessar aos seus eleitores e cidadãos brasileiros. Ou seja, trata-se de uma atividade inerente ao cargo político que o ora Peticionário ocupa e que é desempenhada dentro do exercício de uma legítima atribuição profissional.
“18. Na live do dia 29.07.21, o tema comentado foi a urna eletrônica e o sistema eleitoral brasileiro. O intuito do Presidente da República, por óbvio, não era o de divulgar informações inconsistente ou algo que o valha, mas sim o de promover um debate sobre o tema, propondo, inclusive, uma visão crítica sobre ele4. Algo normal dentro de um espaço democrático, como o que se vive no Brasil, onde se espera que todos os assuntos possam ser discutidos e questionados. Afinal, a impossibilidade de questionamento e o silenciamento de discussões podem ser características de outros regimes de Governo ou de Estado, mas não podem subsistir em um ambiente democrático e plural como o é o da República Federativa brasileira.
“19. Não obstante isto, na decisão proferida em 04.08.21, o ora Noticiado afirma que alguns questionamentos realizados pelo Presidente da República na live do dia 29.07.21 seriam criminosos, razão pela qual ele deveria passar a ser investigado no Inquérito nº 4.781 (fake news). Nesse contexto, o Exmo. Min. Alexandre de Moraes chega a afirmar, em sua fala, que o ora Noticiante teria cometido, em tese, os seguintes delitos: a) art. 138 do Código Penal (calúnia); b) art. 139 do Código Penal (difamação); c) art. 140 do Código Penal (injúria); d) art. 286 do Código Penal (incitação ao crime); e) art. 287 do Código Penal (apologia ao crime ou criminoso); f) art. 288 do Código Penal (associação criminosa); g) art. 339 do Código Penal (denunciação caluniosa); h) arts. 17, 22 e 23 da Lei nº 7.170/83 (crimes de Segurança Nacional); e i) art. 326-A do Código Eleitoral (denunciação caluniosa eleitoral).
“20. Há em tal enquadramento típico um evidente excesso e, sobretudo, uma clara falta de justa causa fundamentada. Dois eventos processuais demonstram o alegado. Em primeiro lugar, as manifestações da Procuradoria-Geral da República realizadas no Inquérito nº 4.781 (fake news) sobre os fatos que são investigados. Em seus pareceres, o Órgão Máximo Acusatório é claro em dizer que, na qualidade de dominus litis, não vislumbra a ocorrência de nenhum crime nos fatos investigados, não passando as publicações perquiridas ou de manifestações livres de pensamento ou de exercício da imunidade parlamentar contida no art. 53 da Constituição da República. Confira-se o teor dos pareceres da Procuradoria-Geral da República acostados aos autos:
“a leitura dessas manifestações demonstra, à despeito de seu conteúdo incisivo em alguns casos, serem inconfundíveis com a prática de calúnias, injúrias ou difamações contra os membros do STF. Em realidade, representam a divulgação de opiniões e visões de mundo, protegidas pela liberdade de expressão (…) na medida em que as manifestações feitas em redes sociais atribuídas aos investigados inserem-se na categoria de crítica legítima – conquanto dura -, ao ver deste órgão ministerial são desproporcionais as medidas de bloqueio das contas vinculadas aos investigados nas redes sociais (…) a desproporcionalidade das medidas de bloqueio das contas nas redes sociais é ainda marcante no que concerne aos investigados detentores de foro por prerrogativa de função. A divulgação do trabalho e das ações realizadas pelos investidos em cargos eletivos nas redes sociais é importante medida de publicidade e accountability na atualidade. Seria medida contrária ao interesse pública privar esses agentes políticos desse canal de comunicação popular. É de se ter em conta, ainda, que os investigados parlamentares são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos (art. 53 da Constituição Federal). A jurisprudência desse STF tem se orientado no sentido de que opiniões emitidas por parlamentares fora do recinto da Casa Legislativa de que são integrantes – como é o caso de publicações em redes sociais – são invioláveis, desde que haja nexo de causalidade entre elas e a função parlamentar. Considerando que as manifestações públicas investigadas nos autos são relativas a críticas dirigidas aos membros do STF no exercício de suas atribuições funcionais, está configurado o nexo de causalidade necessário para a garantia da imunidade parlamentar, salvo aquelas que se dirijam à vida privada, extensiva aos respectivos familiares” (Fls. 159-161 dos autos de Apenso nº 70)
***
“Em publicações (…) nas redes sociais com dizeres “Fora Gilmar” e “Impeachment Gilmar Mendes”, as quais não caracterizam excesso criminoso. Ainda é possível extrair dos autos, a partir de Relatório Técnico elaborado pela Polícia Civil do Estado de São Paulo (fls. 4985/5002, numeração original do INQ 4.781), postagens no perfil do Movimento Conservador no Instagram e no perfil de EDSON no Twitter consubstanciadas em críticas ao Ministro Gilmar Mendes, ao Supremo Tribunal Federal, mais precisamente no que tange à jurisprudência relativa à prisão após decisão em segunda instância, bem como a convocação da população para participação de manifestações nas ruas. Às fls. 5620/5634 (numeração original do INQ 4.781), são mostrados prints de publicações no perfil do Movimento Conservador no Twitter nesses mesmos moldes: são opiniões contrárias à atuação do Ministro Gilmar Mendes, com referência a pedido de impeachment, favoráveis à prisão após decisão em segunda instância e convocatórias de protestos. Tais manifestações, sob a perspectiva deste órgão ministerial, são incapazes de atingir institucionalmente o STF”. (fls. 670-687 dos autos de Apenso nº 70)
“21. Conforme se lê, o próprio Ministério Público Federal é assertivo em constatar a falta de justa causa fundamentada nos autos, alegando que as publicações que são objeto do Inquérito 4.781 (fake news), no qual foi incluído o ora Noticiante como investigado, não possuem qualquer coloração penal e são incapazes de atingir institucionalmente o Supremo Tribunal Federal. Mas, ainda sobre o tema, há outro evento processual que deve ser ressaltado para se comprovar o ponto.
“22. Em segundo lugar – especificamente com relação aos fatos que envolvem o ora Noticiante (declarações em sua live no dia 29.07.21) – a Polícia Federal, após ouvir testemunhas e realizar laudos periciais, igualmente concluiu pela inexistência de justa causa fundamentada, apta a encontrar indícios de autoria e materialidade suficientes para o oferecimento de denúncia. De fato, instada a averiguar as condutas do Presidente da República, a Autoridade Policial apresentou relatório no qual concluiu que “a recente publicação da lei n° 14196, de 26 de agosto de 2021, não contemplou o tipo penal de comunicação enganosa em massa”. Nesse contexto, a contrario sensu, ao indicar eventual tipificação penal aplicável ao ora Noticiante, a Polícia Federal consignou que “o evento, em tese, poderia repercutir nos tipos de fazer propaganda, em público, de processo ilegal para subversão da ordem política ou social (artigo 22, incisos I e IV, da Lei n° 7.170/83) e de incitar a subversão da ordem política ou social (art. 23, inciso I, da mesma lei)”. No entanto, tanto o art. 22, quanto o art. 23 da Lei nº 7.170/83 foram integralmente revogados pela Lei nº 14.197/21 e não tiveram continuidade normativa nos novos artigos inseridos no Código Penal por tal Lei (ars. 359-I a 359-T). Confira-se o teor do Relatório confeccionada pela Delegada de Polícia Federal oficiante no caso (doc.8):
“Importa reconhecer que a recente publicação da lei nº 14.196, de 26 de agosto de 2021, não contemplou o tipo penal de comunicação enganosa em massa (…) Embora ainda em vacatio legis, o novo texto promover alterações de cenário que impactam na tipificação de condutas atribuídas aos envolvidos nos fatos. Nesse quadro, o evento, em tese, poderia repercutir nos tipos de fazer propaganda, em publico, de processo ilegal para subversão da ordem política ou social (artigo 22, incisos I e IV, da Lei nº 7.170/83) e de incitar a subversão da ordem política ou social (art. 23, inciso I, da mesma lei)” (Relatório da Autoridade Policial, fls. 171-172 dos autos)”
“23. Por conseguinte, a leitura do Relatório da Polícia Federal acostado aos autos de Inquérito nº 4.781 (fake news) e aos autos de Petição nº 9.005 permite concluir que os fatos atribuídos ao Presidente da República, cuja investigação foi aberta de ofício pelo Exmo. Min. Alexandre de Moraes, sem manifestação da Procuradoria-Geral da República, ou são atípicos, uma vez que não existe o tipo penal de comunicação enganosa em massa, ou foram atingidos pelo instituto da abolitio criminis, e isso porque os arts. 22 e 23 da Lei nº 7.170/83 não existem mais no ordenamento jurídico. Logo, por todos os ângulos que se olhe, é forçoso concluir que a inclusão do Noticiante no Inquérito nº 4.781 (fake news) foi realizada sem justa causa fundamentada e sem qualquer indício de materialidade delitiva.
“24. A reforçar ainda mais a falta de justa causa para a inserção do Presidente da República nas investigações, está o cotejamento entre os tipos penais indicados pelo ora Noticiado em sua decisão de 04.08.21 e os fatos imputados ao ora Noticiante. No caso em análise tem-se o seguinte quadro de qualificação típica. Primeiro, delitos contra a honra (calúnia, difamação e injúria) que não foram objeto nem de Queixa-Crime, nem de representação, já tendo sido atingidos pelo instituto da decadência. Segundo, infrações de incitação e de apologia ao crime que teriam sido cometidas por intermédio de falas do Mandatário Nacional que não incitaram ou realizaram apologia em favor de qualquer delito ou criminoso. Terceiro, delitos de denunciação caluniosa que teriam sido praticados em um pronunciamento onde não há imputação de crime a qualquer pessoa5, sendo que, a partir das falas do Presidente da República, não foi aberto nenhum procedimento administrativo ou judicial em desfavor da suposta vítima de tal denunciação caluniosa. Quarto, crimes contra a Segurança Nacional que ou já foram revogados ou versam sobre fatos atípicos. Quinto, delito de associação criminosa quando, em verdade, o vínculo que liga o ora Noticiante aos demais investigados é lícito, estando comprovada a ausência de qualquer união para prática delitiva. Logo, a toda evidência, os fatos investigados são atípicos e a inserção do Presidente da República no Inquérito nº 4.781 (fake news) ocorreu sem justa causa fundamentada e sem qualquer indício de materialidade delitiva.
“25. De toda sorte, ao assim proceder com relação aos Inquéritos nº 4.781 (fake news), nº 4.828 (atos antidemocráticos) e nº 4.874 (milícias digitais), o Exmo. Min. Alexandre de Moraes pode ter incorrido em, ao menos, cinco delitos de abuso de autoridade, dispostos na Lei nº 13.869/19. De fato, da análise da atuação do ora Noticiado nos três procedimentos indicados, extrai-se sua possível incursão nas condutas tipificadas pelos arts. 27, 29, 31, 32 e 33, todos da Lei n° 13.869/19. É o que passa a ser detalhadamente exposto adiante.
“- 2 – 1º fato: duração não razoável da investigação
O primeiro tipo penal atribuível ao ora Noticiado decorre do fato de que o Inquérito n° 4.781 (fake news) foi instaurado há mais de três anos e, mesmo assim, até o momento não fora apresentado sequer um relatório parcial de investigações por parte da Autoridade Policial. Considerando que, de acordo com o próprio Exmo. Min. Alexandre de Moraes, todo o material relacionado aos investigados estaria contemplado no Apenso nº 70, de duas hipóteses, ao menos uma. Ou o Inquérito nº 4.781 (fake news) está, injustificadamente, sendo estendido em prejuízo dos investigados, uma vez que após mais de trinta e seis meses não há nem mesmo um relatório parcial das investigações. Ou, então, há relatórios parciais e justificativas para prosseguimento do Inquérito que estão sendo ocultados das defesas. Na primeira hipótese, restará configurado o delito objeto deste tópico, previsto no art. 31 da Lei n° 13.869/19. Na segunda hipótese, restará evidente a prática da conduta penalmente tipificada no art. 32 da Lei n° 13.689/19. Passa-se, então, à análise da adequação típica em relação à primeira hipótese.
No que diz respeito à adequação típica da conduta perpetrada pelo ora Noticiado, importante mencionar que o caput do art. 31 da Lei nº 13.869/19 prevê como crime a conduta de “estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado”. Trata-se de crime material cuja configuração exige, de fato, uma extensão injustificada da investigação, e que esse prolongamento imotivado seja em prejuízo do investigado.
Pois bem. Quanto à extensão das investigações, como suficientemente abordado nos parágrafos anteriores, o Inquérito n° 4.781 (fake news) foi instaurado em 19.03.19. Ou seja, trata-se de uma investigação que se estende por mais de três anos; prazo este que representa o dobro do lapso cronológico que o Supremo Tribunal Federal considera como capaz de causar constrangimento ilegal ao investigado por excesso de prazo. De toda sorte, para que não restem dúvidas acerca da não razoável duração das investigações, três pontos merecem destaque.
O primeiro ponto diz respeito à previsão legal de que, no Supremo Tribunal Federal, nem mesmo a instrução, isto é, nem mesmo a Ação Penal principal, pode durar mais do que dois anos. O comando legal advém do art. 3º, inc. III, da Lei n° 8.038/90, que dispõe sobre a convocação de Desembargadores e Juízes instrutores para que atuem “até o máximo de dois anos” na realização do interrogatório e de outros atos da instrução. Ora, se nem mesmo a instrução da Ação Penal pode durar mais de dois anos, parece mais lógico ainda que a investigação, carente de qualquer juízo indiciário (como ocorre na denúncia) e de caráter inquisitorial, deva durar ainda menos tempo, inferior a dois anos. Assim, tem-se, de um lado, a Lei n° 8.038/90, a qual prevê que a instrução da Ação Penal não deve durar mais de dois anos. No entanto, de outro lado, no Inquérito n° 4.781 (fake news), as investigações perduram há mais de três anos.
O segundo ponto versa sobre o que dispõe o art. 230-C do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, segundo o qual o Inquérito deve ter duração de, no máximo, sessenta dias. No entanto, no caso do Inquérito nº 4.781 (fake news), ele perdura por lapso cronológico superior em quase vinte vezes o marco temporal disposto no Regimento Interno do Pretório Excelso. Ademais, o prazo de duração do Inquérito nº 4.781 (fake news) supera por duas vezes o lapso cronológico disposto na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como capaz de gerar constrangimento ilegal por excesso de prazo. Deveras, os julgados do Pretório Excelso demonstram que, a partir de um ano e dois meses, há excesso de prazo no trâmite de um Inquérito Policial – nesse sentido foi o julgamento dos Inquéritos nº 4.442, nº 4.429, nº 4.441 e nº 4.454 – sendo que aqui está-se diante de um Inquérito que perdura pelo dobro do marco temporal considerado como excesso de prazo pelo Supremo Tribunal Federal.
E não se pode alegar que a extensa duração do Inquérito nº 4.781 (fake news) estaria justificada porque os fatos são complexos e as diligências investigativas ainda estão em andamento. Isso não pode ser dito porque as diligências instrutórias do feito em questão já foram realizadas há muito tempo. De fato, os laudos de análises periciais foram apresentados entre fevereiro e abril de 2.020, ou seja, há mais de dois anos. Além disto, os depoimentos das testemunhas e investigados foram colhidos entre dezembro de 2.019 e junho de 2.020, ou seja, há mais de ano, sendo que a operação ostensiva realizada em tal feito ocorreu há quase dois anos, em maio de 2020. Logo, não há ato investigativo que justifique tal excesso de prazo, uma vez que as principais ações de perquirição já foram realizadas há, no mínimo, um ano.
Especificamente com relação ao ora Noticiante, o mesmo pode ser dito. A inclusão do Presidente da República no Inquérito nº 4.781 (fake news) ocorreu em agosto de 2021. Todos os depoimentos relativos a tais fatos foram colhidos entre agosto de 2021 e setembro de 2021, sendo que a perícia confeccionada pela Polícia Federal sobre a live do dia 29.07.21 foi apresentada em 09.09.21. De outro giro, o Relatório da Delegada de Polícia Federal atuante no feito, com relação ao fato específico que envolve o Mandatário Nacional, foi aviado aos autos em 13.09.21 – há mais de oito meses – concluindo, ainda que sem o dizer expressamente, pela inexistência de fato típico na conduta do ora Noticiante. E, mesmo assim, até a presente data, o Inquérito nº 4.781 (fake news) continua a tramitar, seja com relação ao Presidente da República, seja no que tange aos demais investigados.
Por fim, o terceiro ponto, versa sobre o fato de que o Inquérito nº 4.781 (fake news), além de tramitar – sem nenhuma justificativa – por nada menos do que vinte vezes o prazo que o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal prevê como correto para a duração de um Inquérito, além disto, ele processa fatos que, na visão da própria Procuradoria-Geral da República e da Polícia Federal, são atípicos. De fato, conforme já mencionado acima, o Órgão Máximo Acusatório já afirmou, por duas vezes nos autos, que os fatos investigados no Inquérito nº 4.781 (fake news) são atípicos, de sorte que nem a própria Autoridade que poderia ofertar denúncia em tal caso acredita existir justa causa fundamentada para o processamento do Inquérito em questão. Ademais, especificamente com relação à situação do Presidente da República, até mesmo a Polícia Federal já disse que os fatos apurados ou são atípicos, ou deixaram de ter tipicidade com a revogação da Lei nº 7.170/83.
Portanto, tudo somado, tem-se um Inquérito que se estende por prazo injustificável – três anos e um mês – , mormente porque, de um lado, as diligências de investigação já foram todas realizadas há bastante tempo, e, de outro lado, os fatos investigados, segundo a opinião do próprio dominus litis, são atípicos. Eis as razões pelas quais a primeira elementar objetiva descrita no art. 31 da Lei nº 13.869/19 poderia, em tese, estar preenchida no quadro jurídico em debate. Qual a justificativa de se manter um Inquérito quando a própria Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal afirmam que não há crime nos fatos que estão sendo investigados? Eis porque não há qualquer razão que fundamente a subsistência do Inquérito nº 4.781 (fake news) por tanto tempo.
Em seguida, com relação ao prejuízo enfrentado pelos investigados com a extensão injustificada do Inquérito nº 4.781 (fake news), este igualmente é evidente e salta aos olhos. Especificamente com relação ao ora Noticiante, porque ele é Presidente da República e tem contra si um Inquérito que investigada fato claramente atípico e o pior: que continuará a existir mesmo em ano eleitoral. Por óbvio, o prejuízo político ocasionado ao Mandatário Nacional com a subsistência de tal Inquérito é evidente e de fácil constatação. A demonstrar o alegado, basta-se deitar os olhos na imprensa brasileira e constatar a quantidade de matérias pejorativas que foram publicadas contra o Presidente da República em razão de sua inclusão no Inquérito nº 4.781 (fake news). Portanto, não só a duração de tal feito é injustificada, como, mais do que isto, ela traz gravíssimo prejuízo ao ora Noticiante. Eis porque se entende que, em tese, o delito previsto no art. 31 da Lei nº 13.869/19 poderia estar configurado in casu.
Dessa forma, com fundamento no que prevê o art. 5º, inciso II, do Código de Processo Penal, requer-se a abertura de Inquérito Policial, em desfavor do Exmo. Min. Alexandre de Moraes, a fim de que, por conta da extensão injustificada que ele vem conferindo ao Inquérito nº 4.781 (fake news), a qual ocasiona prejuízo do Presidente da República, verifique-se a incidência do tipo penal disposto no art. 31 da Lei nº 13.869/19 no caso em tela.
“- 3 – 2º fato: negativa de acesso aos autos
O segundo delito de abuso de autoridade possivelmente praticado pelo ora Noticiado decorre das trinta e seis decisões que ele proferiu, ao longo dos últimos três anos no bojo do Inquérito n° 4.781 (fake news), através das quais ele negou o acesso das defesas a diversos documentos já colacionados aos autos e utilizados em desfavor dos investigados na decisão de deflagração de operação proferida em 26.05.20. Ademais, é de se ponderar que, até onde se tem conhecimento, a última diligência investigativa foi realizada nos autos em setembro de 2.021, sendo que – até a presente data, maio de 2.022 – nenhuma defesa teve acesso integral aos autos de Inquérito nº 4.781 (fake news).
Por Portal Novo Norte