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O Caladinho, a Petrobras e o Ministério de Minas e Energia

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OPINIÃO

Na semana passada, voltei do chope com meus velhos companheiros de papo e copo – e põe copos e velhos nisso! –, remoendo uma dúvida, mesmo sem ter a menor influência ou responsabilidade sobre o assunto. Aconteceu que, naquela reunião, veio à baila a mais recente demissão do presidente da Petrobras, aparentemente por desentendimentos com o do Ministério de Minas e Energia (MME).

Uma opinião aqui, outra ali, o sempre ouvinte e calado Zé Caladinho, surpreendentemente, resolveu falar. Pelo inusitado, atraiu a atenção de todos:

“Vocês me chamam de Caladinho porque eu falo pouco. Mas, vejam bem, vocês falam muito, discutem, se exaltam, e não concluem nada. Não propõem nada. Ainda não entenderam que essa pendenga entre o ministério e a Petrobras é uma discussão inútil, que não terminará nunca? O espaço é pequeno para os dois órgãos atuarem simultaneamente. O cobertor é curto. Querem acabar com isso de uma vez por todas? Querem mesmo? Então eliminem um dos dois contendores. Qual? Ora, o que fará menos falta. Qual? O ministério, sem dúvida.”

Depois do espanto geral, primeiro por Zé ter falado e, segundo, pela ousadia da proposição, aquela opinião alojou-se no meu cérebro. Ali ficou e não saiu, nem com a eliminação do álcool e a dor de cabeça do dia seguinte. Será que ele tem razão? Faz sentido?

A Petrobras foi criada para operacionalizar o monopólio do petróleo nacional, dentro da lei 2004 de 03 de outubro de 1953, com a missão maior de “garantir o abastecimento nacional de combustíveis e derivados de petróleo, aos menores preços possíveis para os consumidores”. E isso ela cumpriu com muita competência, inclusive durante os dois grandes choques de petróleo em 1973 e 1979. Mesmo os mais distantes rincões do Brasil nunca sofreram desabastecidos em nenhum momento.

Ajudar o desenvolvimento do Brasil, mesmo com alguma justificável redução da lucratividade empresarial, sempre foi considerada por seus dirigentes e empregados (Oops! O chique agora é dizer colaboradores) uma obrigação da empresa, em justa contrapartida ao privilégio do monopólio permitir atuar, sem concorrência, na exploração e produção de petróleo, em todo o território nacional. Com essas premissas forjou-se a cultura empresarial Petrobras que, superando desafios gerenciais, financeiros e tecnológicos, formou várias gerações de petroleiros e colocou-a entre as cinco maiores empresas de petróleo do mundo. Até aí, acredito que todos os analistas com bom senso e honestidade concordarão com o que escrevi, pois é história.

Aconteceu que, com a quebra do monopólio em 1997 e a criação da Agência Nacional de Petróleo em 1978, a Petrobras ganhou concorrentes nacionais e estrangeiros e, desse modo, deixou de ter a “obrigação” de ajudar o desenvolvimento nacional, passando a trabalhar, como qualquer empresa séria, visando crescer e perpetuar-se, operando com a maior eficiência possível para otimizar os investimentos e maximizar os lucros dos seus acionistas, do qual o maior e mais importante é o governo brasileiro. Desde então, cabe ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética), ao CADE (Conselho Administrativo de Política Econômica) e a ANP (Agência Nacional de Petróleo) cuidarem dos objetivos, estratégia, regulamentação e fiscalização das atividades da indústria do petróleo nacional.

Vejam que não citei o Ministério de Minas e Energia. E por que não o fiz? Porque, conforme o diagnóstico do nosso Caladinho, que – registre-se – mesmo argumentando com muita convicção pode estar errado, mas não pode ser ignorado.

“Após as privatizações da Siderbrás, da Eletrobras e da Vale, o MME ficou esvaziado e, certamente, com sobra de pessoal e redução de atribuições. Daí a voltar-se para interferir demasiadamente nas atividades da Petrobras foi um pulo. Acrescente-se que, considerando toda a competência técnica, comercial e geopolítica acumulada pela Petrobras ao logo dos anos, creio que, atualmente, o MME em nada, ou quase nada, contribui para a melhoria técnica-operacional-empresarial da empresa e, portanto, não faz mais sentido comandá-la.”

Zé Caladinho afirmou ainda, com veemência, que “aquele ministério onde está localizado, entre o presidente da República e a Petrobras, apenas reduz a velocidade das decisões, dilui as responsabilidades dos gestores, e é mais um alvo de lobbies e interferências políticas. Obviamente, se ligada diretamente ao presidente da República, sem intermediários, a Petrobras se tornará mais ágil e eficiente, com autonomia gerencial para disputar o mercado com seus concorrentes nacionais e, principalmente, internacionais. E, naturalmente, reduzirá as crises institucionais que tanto atemorizam os acionistas privados”.

E ele continuou:

“Por outro lado, o MME poderia dedicar-se mais ao incentivo, desenvolvimento e fiscalização das atividades ligadas à economia mineral brasileira que, apesar da enorme importância estratégica, é mais lembrada pela garimpagem nefasta e ilegal. Além disso, poderia cuidar de alguma atividade remanescente ligada a energia elétrica e ao incentivo do desenvolvimento das energias renováveis.”

Agora, pergunto eu:

“Quem sabe os especialistas em Estrutura Organizacional do governo federal, mesmo desconhecendo o Caladinho, poderiam analisar em profundidade a sua sugestão? Assim, eu poderia tirar a dúvida da minha mente e preocupar-me apenas com algo verdadeiramente importante: o provável rebaixamento do Vasco da Gama no Brasileirão.”

Por: Alfeu Valença
Ex-presidente da Petrobrás e fundador da CONPET Consultoria e Engenharia de Petróleo.
Alfeu assina a coluna no site https://temporealrj.com/alfeu/

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