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Dengue: tire as principais dúvidas sobre a doença

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Mais de 1 milhão de brasileiros já foram infectados pelo mosquito Aedes aegypti nos primeiros dois meses do ano; estimativa é de mais de 4 milhões de casos até dezembro 

Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein 

Nos primeiros dois meses do ano, o registro de casos prováveis de dengue no Brasil já ultrapassou 1 milhão. O número é mais de seis vezes do que o computado no mesmo período do ano passado (165.849 casos), segundo os dados mais recentes do painel de arboviroses do Ministério da Saúde, que monitora o avanço da doença diariamente. Somente neste ano, o Brasil já confirmou 214 mortes pela doença e outros 687 óbitos estão em investigação, sob a suspeita de também terem sido consequência da dengue.  

A doença é considerada um sério problema de saúde pública e provavelmente ainda não atingiu o seu pico. Até o final do ano, estima-se que o Brasil registre cerca de 4,2 milhões de casos de dengue – um recorde histórico. Vários fatores influenciam para a explosão de casos, desde as mudanças climáticas até a volta de circulação de outros sorotipos. Mas, depois de mais de 40 anos de epidemia de dengue, o que sabemos é que é possível prevenir a doença e evitar as mortes com medidas básicas de prevenção e abordagem clínica correta. 

Agência Einstein ouviu infectologistas para tirar as principais dúvidas sobre a doença, passando por transmissão, sintomas, tratamento e prevenção.  

1 – O que é a dengue? 

A dengue é uma doença infecciosa viral que faz parte de um grupo de doenças denominadas arboviroses. Ela representa um grande problema de saúde pública não apenas no Brasil, mas também em vários países da América Latina. É transmitida pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti

Segundo a infectologista Emy Akiyama Gouveia, do Hospital Israelita Albert Einstein, pessoas de qualquer idade podem se contaminar, porém as gestantes, pessoas com mais de 65 anos, indivíduos com comorbidades e crianças até 2 anos têm o risco aumentado de desenvolverem a forma mais grave da doença e apresentar outras complicações, entre elas, o óbito. 

“É importante ressaltar que o mesmo mosquito da dengue também pode transmitir outras doenças virais importantes, como Chikungunya e Zika. Por isso, é essencial fazer o diagnóstico correto e buscar o auxílio médico adequado”, disse a infectologista.  

2 – Existem tipos diferentes de dengue? 

Sim. O vírus da dengue possui quatro sorotipos: DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4 e não apresentam diferenças clínicas. Nem todos os subtipos circulam ao mesmo tempo. Nos últimos anos, os sorotipos 1 e 2 foram os mais prevalentes. Em alguns estados, há a circulação do sorotipo 4 e, após 15 anos, o sorotipo 3 começa a ser detectado. 

3 – Qual a principal diferença entre o pernilongo comum e o mosquito da dengue? 

Duas das principais diferenças envolvendo os dois mosquitos são a coloração e o tamanho: enquanto o pernilongo comum (Culex) é marrom e mede entre 3 e 4 mm, o mosquito da dengue (Aedes aegypti) é preto com listras brancas e é maior, medindo entre 5 e 7 mm. Outro detalhe também pode ajudar a diferenciá-los: o pernilongo comum costuma ser mais barulhento e voar mais devagar, já o mosquito da dengue é mais silencioso e ágil. 

Segundo Gouveia, é importante ressaltar que, embora o mosquito da dengue tenha hábitos mais diurnos e costume picar as pessoas mais frequentemente no período da manhã, ele também pode picar no período noturno.  

4 – É verdade que o vírus é transmitido apenas pela picada da fêmea?  

Sim. O vírus da dengue é transmitido somente pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti. “A fêmea suga o sangue com o objetivo de amadurecimento dos ovos”, explicou Gouveia.  

5 – Como ocorre a transmissão da doença?  

O mosquito se adaptou ao ambiente urbano e se reproduz principalmente em depósitos de água limpa e parada. Apesar disso, o mosquito evoluiu e adquiriu capacidade de proliferação em água com matéria orgânica. Seus ovos são depositados nas paredes de recipientes como garrafas, bandejas de ar-condicionado, calhas entupidas, vasos de plantas, pneus e até de piscinas não utilizadas. 

Os ovos são escuros e muito pequenos – do tamanho de um grão de areia – e conseguem resistir a um ambiente seco por cerca de um ano. No período de chuvas, os ovos eclodem e surgem as larvas, que evoluem para pupa e depois para a forma de mosquito adulto, em um processo que demora entre sete e dez dias. A partir de então, as fêmeas saem e picam os humanos. 

6 – Toda picada de fêmea do Aedes transmite a doença? 

Não necessariamente. A fêmea do mosquito Aedes aegypti tem que estar contaminada pela dengue para transmitir a doença. Isso pode acontecer após ela picar um humano contaminado e, se ela já estiver infectada quando puser seus ovos, há a possibilidade de as larvas nascerem com o vírus (um processo chamado de transmissão vertical).   

7 – Quando surgem os sintomas? 

Nem sempre a pessoa contaminada com dengue desenvolverá sintomas – ela pode ser totalmente assintomática ou apresentar um quadro leve, que passa praticamente sem perceber. Mas, em geral, após a picada do mosquito infectado, o indivíduo poderá desenvolver sintomas em um intervalo de três a 15 dias. Mas normalmente os sintomas surgem após cinco ou seis dias da picada. 

8 – Em que momento uma pessoa com sintomas sugestivos de dengue deve procurar um serviço de saúde para diagnóstico? 

De acordo com a infectologista do Einstein, todo indivíduo que apresente os sinais e sintomas sugestivos da doença deve procurar atendimento médico para avaliação de risco. Os principais sinais e sintomas são: 

Se a pessoa apresentar febre alta repentina (entre 39º e 40º C) acompanhada de pelo menos dois desses sintomas abaixo, ela deve procurar um serviço de saúde: 

  • Dor de cabeça intensa 
  • Dor atrás dos olhos 
  • Dor nas articulações ou nos músculos 
  • Prostração 

Se após o declínio da febre (entre o terceiro e o sétimo dia após o início da doença), outros sinais continuarem presentes, é preciso buscar novamente o serviço de saúde porque eles podem indicar a evolução para uma forma grave da doença e a piora do quadro

  • Dor abdominal intensa e contínua 
  • Náusea e vômitos persistentes 
  • Manchas vermelhas pelo corpo (hemorragias) 
  • Acúmulo de líquido nas cavidades corporais 
  • Sangramento de mucosas 
  • Letargia e irritabilidade 

9 – Como é feito o tratamento da dengue? 

Não existe um medicamento específico para o vírus da dengue – o tratamento é baseado principalmente na reposição de líquidos e no controle de sintomas. Em geral, como a maioria dos casos é leve, a recuperação completa acontece em torno de dez dias.  

A recomendação dos médicos é que a pessoa com dengue tome os seguintes cuidados: 

  • Repouso enquanto durar a febre 
  • Ingestão de líquidos 
  • Uso de paracetamol ou dipirona em caso de dor ou febre 
  • Para o controle da dor e da febre, não utilizar AAS (ácido acetilsalicílico) e de anti-inflamatórios não hormonais (como diclofenaco, ibuprofeno etc.) a fim de minimizar o risco de sangramentos 
  • Retorno ao serviço de saúde em caso de piora dos sintomas ou quando o médico orientar que o paciente deve retornar para reavaliação 

10 – Quais medicamentos eu não posso tomar? 

“Anti-inflamatórios não hormonais, como diclofenaco e ibuprofeno, não são indicados, além do ácido acetilsalicílico, pois eles podem favorecer os sangramentos”, explica a médica. Caso já utilize esses medicamentos, consulte seu médico. 

11- A doença acontece o ano inteiro? 

A dengue é uma doença sazonal – costuma acontecer nos períodos mais quentes e chuvosos (especialmente entre os meses de outubro e maio). No entanto, aspectos como a urbanização, o crescimento desordenado da população, o saneamento básico deficitário e os fatores climáticos mantêm as condições favoráveis para a presença do vetor e da doença o ano inteiro.  

12 – O que explica o aumento significativo no número de casos? 

Ainda não é possível saber o que tem motivado o aumento de casos de dengue. De acordo com Gouveia, uma série de fatores contribuem e, entre eles, as alterações climáticas, com o regime de chuvas intensas e temperaturas secundárias ao aquecimento global, além da suscetibilidade da população – a circulação de novos sorotipos resulta em novas infecções.  

“Lembrando que temos quatro sorotipos do vírus da dengue. A maioria das infecções nos últimos anos no Brasil foi pelos sorotipos 1 e 2. A chegada do sorotipo 3, que não circulava havia cerca de 15 anos, encontrará indivíduos mais suscetíveis”, destacou a infectologista. Segundo ela, há também o descuido com as medidas de prevenção relacionadas aos focos de água parada. 

Na avaliação do infectologista Luís Fernando Aranha Camargo, professor de infectologia da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein, provavelmente o que acontece é uma combinação que envolve a falta de controle do vetor (que normalmente fica a cargo do município e do estado), as condições ambientais (o acúmulo de chuva e água não tratada) e o ciclo natural das epidemias, muitas vezes relacionadas com a imunidade. 

“Em anos com muitos casos de dengue, você acaba imunizando um pouco mais da população para o ano seguinte. Depois de certo tempo, com outro sorotipo circulando, você perde a imunidade de massa e isso aumenta o número de suscetíveis. Combinando todos esses fatores, você tem um ciclo explosivo de casos de dengue”, explicou o professor. 

13 – Posso ter dengue várias vezes? 

Sim. Como existem quatro sorotipos da doença, uma pessoa pode se contaminar até quatro vezes ao longo da vida – cada vez por um dos sorotipos. A recuperação da infecção por um sorotipo proporciona a imunidade vitalícia apenas contra ele. 

14 – É verdade que uma segunda contaminação aumenta o risco de dengue grave? 

Sim. A pessoa só garante a imunidade permanente contra o sorotipo pelo qual foi contaminada. Ao ser picada e contaminada novamente por qualquer um dos outros sorotipos da dengue, aumenta-se o risco de desenvolver a forma mais grave da dengue. 

“Os quatro sorotipos da dengue não causam diferenças clínicas – os sintomas são os mesmos, independentemente do subtipo que contaminou a pessoa. O que ocorre é que, quando acontece a segunda infecção, há o maior risco de desenvolvimento das formas graves da doença por causa de fenômenos imunológicos. O termo correto é dengue grave, tendo em vista que nem sempre o paciente vai apresentar hemorragia”, destacou Gouveia. 

15 – Quais as formas de prevenção? 

Uma das principais formas de prevenir a transmissão da dengue é o controle do mosquito vetor da doença – evite deixar água parada em recipientes, pneus, vasos, calhas. Estima-se que 80% dos criadouros do mosquito estão dentro das casas. O controle do mosquito vetor acontece por meio de ações dos órgãos públicos, com campanhas de orientação e visitas dos agentes de saúde às casas em busca de criadouros e por meio das ações pessoais.  

É importante entender que adotar medidas de controle ao vetor é essencial para reduzir a transmissão do vírus. 

16 – E a vacina contra a dengue? 

A vacinação é mais uma importante ferramenta na busca pelo controle da doença, que continua causando a epidemia no Brasil. Ela ainda não está amplamente disponível para todas as pessoas.  

No início de 2023, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o registro da vacina Qdenga, da farmacêutica Takeda. Em dezembro do mesmo ano, o Ministério da Saúde anunciou a incorporação da vacina ao Sistema Único de Saúde (SUS). Com isso, o imunizante integrou o Calendário Nacional de Vacinação em 2024 por meio da aplicação de duas doses.  

Por enquanto, a vacina será oferecida em municípios com mais de 100 mil habitantes que tiveram altas taxas de transmissão da doença. O público-alvo são crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos. 

Com essa decisão, o Brasil se tornou o primeiro país do mundo a oferecer a vacina contra a dengue no sistema público de saúde. Essa vacina também estava disponível nos Centros de Imunização da rede privada, porém em quantidades limitadas porque a prioridade do laboratório é atender o sistema público de saúde. 

“A vacina da Takeda é extremamente importante porque ela mostrou uma eficácia importante durante até quatro anos depois da vacinação. Embora ao longo dos anos a eficácia tenha diminuído, na prática constatou-se que tomar a vacina promove de duas a duas vezes e meia menos risco de ter dengue do que não tomar a vacina. É um resultado bem razoável”, disse o infectologista Camargo. Outra vantagem da vacinação, segundo o médico, é que ela diminuiu casos de internação e de dengue grave. 

Além disso, o Instituto Butantan também está desenvolvendo uma vacina contra a dengue que até o momento apresenta resultados promissores – os resultados do estudo clínico com 16.235 voluntários apontaram a eficácia de 79,6% com uma única dose do imunizante, o que é uma vantagem. A expectativa é apresentar os dados para o pedido de registro à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no segundo semestre de 2024.  

“A vacina do Butantan tem uma vantagem, que é a administração em dose única. E, em até dois anos de estudo, ela tem se mostrado bastante eficaz, em torno de 80%”, disse o professor. Segundo Camargo, o maior desafio é conseguir promover a vacinação em massa da população. 

17 – O uso de repelentes protege contra a picada do mosquito? 

Existem dois tipos de produtos usados para repelir o mosquito da dengue: os repelentes para aplicação na pele e aqueles para uso no ambiente. Não existem repelentes de uso oral, como comprimidos e vitaminas, com uma indicação aprovada para repelir o mosquito.   

Os repelentes para uso na pele são enquadrados na categoria “cosméticos” e devem obrigatoriamente estar registrados na Anvisa, que é a agência reguladora brasileira. Segundo a Anvisa, todos os ativos repelentes de insetos que já tiveram aprovação podem ser usados em crianças, mas é importante seguir as orientações do rótulo e ficar atento às possíveis restrições de uso.  

Por exemplo, o uso de produtos repelentes de insetos que contenham o ingrediente DEET não é permitido em crianças menores de 2 anos. Já em crianças de 2 a 12 anos de idade, o uso de DEET é permitido desde que a sua concentração não seja superior a 10%, restrita a apenas três aplicações diárias, evitando-se o uso prolongado. 

“Se for usar um repelente na pele, siga sempre as instruções do fabricante e faça a reaplicação de acordo com a indicação. Para a aplicação da forma spray no rosto ou em crianças, o ideal é aplicar primeiro na mão e depois espalhar no corpo, lembrando sempre de lavar as mãos com água e sabonete depois da aplicação. Em caso de contato com os olhos, é importante lavar imediatamente a área com água corrente”, explica a infectologista Gouveia. “Não há a restrição de uso de repelentes por gestantes desde que o produto tenha registro na Anvisa. Elas precisam ter atenção, pois é uma população de risco para evolução para complicações”, disse.

No caso do uso de produtos para o ambiente, como inseticidas e repelentes de tomada, são indicados para matar e afastar mosquitos adultos, respectivamente. Mas a Anvisa faz um alerta importante: os repelentes em aparelhos elétricos ou espirais não devem ser utilizados em locais com pouca ventilação nem na presença de pessoas com asma ou alergias respiratórias. 

18 – Repelentes “naturais”, como citronela, funcionam? 

De acordo com a Anvisa, os inseticidas chamados “naturais”, à base de citronela, andiroba e óleo de cravo, entre outros, não possuem comprovação de eficácia. Ou seja, as velas, os odorizantes de ambientes e os incensos que indicam propriedades repelentes de insetos não estão aprovados pela agência para esse fim.  

19 – Moro em apartamento. Devo me preocupar? 

Sim. Embora o mosquito normalmente voe a uma altura de até cerca de 1,50 m, ele pode subir pelos elevadores e se estabelecer na casa das pessoas que vivem em apartamentos, caso ele encontre algum local com água parada. 

20 – Existem outras medidas caseiras que podem ajudar a prevenir o mosquito? 

As medidas caseiras recomendadas de prevenção são: manter ralos desobstruídos e limpos e, caso apresentem água parada, eles devem ser tampados (as caixas-d’água também devem ter tampadas). Não deixar qualquer tipo de recipiente com água acumulada, como vasos de plantas, garrafas e copos. Olhar as calhas e as lajes para que não tenham água acumulada. Usar telas mosquiteiros nas janelas e portas também auxilia no controle. 

“As pessoas devem ficar atentas a todos os locais em casa que podem acumular água parada, como banheiros pouco utilizados, onde o vaso sanitário fica destampado. Além disso, alguns refrigeradores podem acumular água em bandeja, que não é visível. É importante saber que, sempre que encontramos um Aedes em nossa casa, algum foco está próximo, pois ele não se distancia muito do local onde se proliferou”, disse Gouveia. 

Outro dado importante é ficar atento à visita dos agentes de saúde, que vistoriam as casas em busca de focos de água parada. Estima-se que 80% dos criadouros do mosquito estão dentro das casas. Em São Paulo, diante de qualquer dúvida, ligue 156. Em outras cidades, procure ajuda nos canais oficiais das prefeituras. 

Fonte: Agência Einstein 

Por portal Novo Norte

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